segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

E ali estava, longe de "a quem" queria pertencer, longe de ser quem queria ser... Aquele sítio que sempre fora seu perdia força, perdia sentido... Sentia vontade de segurar o tempo que lhe fugia por entre o coração, sentia vontade de controlar o tempo de trás, de dizer o que jamais seria dito... Perdia-se em si, perdia-se de onde não era por não ser de lá... E assim, perdido de si, perdido em si dos outros gritava o que ninguém conseguia ou poderia ouvir... Todos o julgaram mudo, todos o julgaram perdido e ninguém era capaz de o ouvir... Nada era o que sentia dizer, e inaudível todo ele ficou para sempre.

domingo, 28 de dezembro de 2014

O dia corre cinzento lá fora, o dia corre escuro dentro de si... Sem nada que aparentemente o possa deixar mais escuro que a alma de alguém que tudo perdeu e nada pode ganhar, sente-se escuro e frio e vazio... Vazio de sentido, desprovido de futuro, perdido de sonhos, perdido de tudo. E a vida, essa dança multicolor, continua, hoje escura, amanhã, talvez, cheia de luz... Porque a vida é isto, magia a perder de vista e quando se perde a magia que nos faz brilhar, resta-nos o não brilho... E um dia, quando a vida for só "não brilho" que os momentos de magia o encham por dentro, caso contrário esbarrou com o fim.. O seu fim...

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Partir

Uns partem do princípio, outros partem do fim. E a vida é isto, um partir sempre para outro lado,. Por pouco sentido que faça, por muito que custe, por parecer impossível é preciso partir, partir sempre. Tanto que a vida é sempre a "partir" que no fim parte-se da vida.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

ESD ESL

E a vida nunca é muito mais que nada... Nunca é muito mais que um deixar de ser, um desaparecer em nós, um desaparecer nos outros... Os momentos fantásticos de sempre passam a ser passado irrepetível, os telefonemas de vontade passam a ser uma mensagem anual de boas festas, os momentos partilhados deixam de ser e aos poucos somos nada, somos uma memória perdida em quem já não nos encontra... Somos um silêncio calado nas noites sem barulho... Podemos tentar e acreditar que ainda fazemos algum barulho e gritar, gritar para nunca mais sermos ouvidos... E o fim, dia após dia nos leva para longe de quem fomos e do que quisemos ser, a cada dia o fim puxa-nos para a verdade... A vida é uma longa caminhada para o nada.... E no fim, somos vazio, somos um buraco de memórias, um emaranhado de sonhos perdidos e de vidas desfeitas, um conjunto de desencontros, uma perda de tempo nesse que é de sempre... O fim... E no fim sabemos que ao menos não perdemos sozinhos, o "fim" perde connosco...

domingo, 30 de novembro de 2014

.f

Não foram tão poucas as vezes que lutara contra a perda. Era inconcebível no pensamento dele que perder fosse uma possibilidade, pelo menos uma perda sem luta, sem raiva, sem garra. O perder, perder de braços baixos, de olhar preso ao chão, aquele perder de quem não luta não fazia sentido, nunca o havia feito em si. No entanto, via-se diante da perda, depois de lutar, depois de se vencer a si, depois de tentar vencer o mundo, depois de tentar vencer a razão... Nada a fazer, pensava... A cada minuto que passava a perda ganhava força e forma, era inevitável. "Seria então uma perda?" perguntava-se. "Não teria sido apenas uma vitória durante todo o tempo em que lutara contra o impossível, contra a sonho não realizável?" E, no meio de toda a confusão entre vitória e derrota, de decisão e não decisão, de tristeza e a alegria... O sentimento era o mesmo, era um saber perder sem razão, era um saber não ganhar o que sempre seria... E o sentimento de vazio, quer tenha sido uma pequena vitória ou uma grande derrota, era o mesmo... Era como que se arrancassem a cor ao mundo, era como que se o mar corresse acima das nossas cabeças e a areia nos ficasse sempre entre pés... Era como que se o sol brilhasse abaixo do chão e o céu fosse sempre escuro... Era como que se tivessem cortado a a magia no céu e as estrelas desaparecessem como que por "não magia"... O mundo tornara-se frio, escuro, tornara-se num sítio onde se vivia a peso, a medo, a pena... E nem o sol que lhe aquecia os pés lhe consolava a alma... Perdera-se a ilusão, perdera-se a vontade de voltar a acreditar. Perdera-se o sentido, perdera-se tudo... E no entanto sabe que ganhou, que ganhou o suficiente para tudo a partir dali ser perda. E é o saber do que se nunca saberá que apaga o céu e não mistura as cores.

domingo, 16 de novembro de 2014

Nunca serás... Até ao fim

E... À noite, quando a luz se vai e os medos e o escuro e a verdade te surgem e te acordam do dia que sonhavas, Percebes que lutas e lutarás sempre por um nunca será, que chega a ser enquanto não encostas o corpo à cama e à alma à verdade. Quente pelo sonho, deitaste ainda morno, para começar a gelar no calor que só se faz sentir à superfície... O futuro, esse, há-de vir cheio de nada, cheio do que nunca foi... E vais deitar-te assim, até ao fim dos dias, com quem nunca foste... Vais crescer como quem nunca cresceu realmente. Vais viver como quem já viveu mil anos e hás-de morrer como quem ainda não nasceu. Envolto em sonhos serás sempre feliz, à luz da realidade serás vazio. E no fim quando a luz e o escuro se misturarem, serás só mais uma sombra que vagueia sem norte, sem razão, sem rumo, sem um porto seguro... Sem casa, à procura do que nunca seria, mesmo quando encontrado. À procura do que nunca foi, e do que nunca será serás sempre mentira. Serás a farsa que te não viu viver, tão pouco nascer... Serás vazio, serás nada, serás só a sombra de quem nunca foste.

sábado, 15 de novembro de 2014

Serás?

Entregue ao que nunca será, vive como se fosse para sempre... Entregue ao impossível, vive como se sempre tivesse sido, sem nunca for... Entregue ao que não é, ao que não são, vive como se ser já fosse!! Perguntar-lhe-iam se serão felizes com o que nunca será... Teria como resposta um "foram" enquanto forem... Novamente entregue a si e ao que é, quer voltar a não ser.. Porque o que nunca será, será sempre perfeito. Porque se sabe sempre como é e como seria o que nunca será... Perguntar-lhes-iam como se vive hoje sem amanhã e teriam como resposta que se vive como quem é feliz agora e não se importa de não ser amanhã. Porque, como se só pode ser feliz hoje sem pensar na dor de amanhã, tem de se viver com o impossível de amanhã como o possível de hoje. Sabe que não serão para sempre, sabe que nunca serão. Mas também sabe que não sabe nada. E o impossível de ontem já foi possível hoje e pode ser amanhã. E os dias vão passando e o impossível que será sempre, não o foi até ali. E se nunca se perder na viagem, se nunca se esquecer de quem foram, serão sempre para sempre. Porque nunca se consegue esquecer que se viveu o impossível.

domingo, 2 de novembro de 2014

Pura Magia

Por magia entendia-se, na maioria das vezes, uma ilusão... Um truque, uma forma de enganar o público menos atento... A partir dai passou a chamar-se de ilusionismo e o impacto da ilusão foi destruindo aquilo que se entendia como mágico. A magia deixou de existir simplesmente. Tudo mais não era que um truque, uma farsa, uma ilusão. A magia, aos poucos, perdeu-se na mentira da ilusão... Poucos seriam os que ainda descobriam magia... Verdadeira magia, magia que não mentia... Algures no meio de milhares de pessoas ainda se podia encontrar uma ou outra pessoa capaz de não fazer truques, capaz de não "mentir", capaz de ser verdadeiramente magia. Algures no meio de uma multidão conseguia ver-se alguém capaz de não fazer truques, de ser magia apenas, de não temer enfrentar o mundo com verdadeira magia. Muitos não conseguiriam ver para além da simplicidade de um gesto óbvio, que não engana. Poucos foram os que perceberam que era pura magia... 

Palavra

"Vou escrever-lhe" pensou... Depois entendeu, e bem, que as palavras nunca chegariam para lhe dizer tudo. Não havia nada tão maior que o que tinha para lhe dizer... E, no entanto, as palavras mostravam-se raras, insuficientes, pequenas... Restava-lhe acreditar, acreditar que tudo o que não dizia fosse ouvido e compreendido. Afinal, as palavras não são assim tão importantes... E diz-se que palavras leva-as o vento... E eles eram isso, eram vento, eram tempestade, eram brisa, eram suspiro, eram respirar. Dentro deles tinham o mundo inteiro... As palavras chegariam para dizer que traziam nos seus mundos mares e oceanos, que eram tempestade, que trovoavam de quando em volta, que gritavam mudos, que sorriam um com o outro... Sim as palavras diriam isto... Mas as palavras nunca seriam suficientes para descreverem o que sentiam juntos, para descrever o poder de dois mundos diferentes a chocar um no outro... As palavras nunca seriam capazes de perceber a forma como seguravam o mundo... O mundo um do outro, as palavras seriam sempre poucas ao tentarem contar a forma como eram felizes com tudo ou sem nada, seriam sempre poucas para descreverem o medo que os invadia sempre que se lembravam que existe um universo inteiro e que eles são apenas dois mundos, dois pequenos mundos. 

Quase

Tantas vezes ficamos à beira do quase fizemos que acabamos por nos contentar com o que quase foi feito. Acabamos por ter uma vida que nunca será perfeita porque lutar pela vida que sempre quisemos há-de custar mais que ficar com o futuro que já se tem como certo. Arriscar torna-se cada vez mais sem sentido, a vida, essa, já nos ensinou que o tempo nos consome a alma e o corpo. Somos muitas vezes consumidos pelo passado, tantas vezes consumidos pelo presente, que nos consome o futuro que se nunca alcançará. Caminhamos cheios de  histórias de"teria sido fantástico" e por quase ter sido tantas vezes quase se consegue ser feliz, quase se consegue ser inteiro. E ao fim, consumidos por tudo o que não fomos, por tudo o que não tivemos, há-de chegar o último dia, o que nos consome a alma, o que nos diz que independentemente de todos os cenários possíveis, o fim chegaria sempre. No fim não se pergunta se se foi ou não feliz, se valeu ou não a pena, no fim aceita-se apenas que ser feliz teria sido outra forma de ter chegado ao fim. Como tantas histórias que terminaram antes de começarem, tantos acabam antes de serem felizes. Tantas vezes esbarramos de frente com a felicidade e fugimos-lhe, como que se ficar não fosse mais que destruir a felicidade que seria, tantas vezes nos escondemos para não provarmos o que seria ter sido feliz. Tantas vezes corremos do que teria sido fantástico com medo de que não seja, que de todas as vezes o que acabamos por aproveitar é mais uma oportunidade de não sermos felizes. E aceitamo-lo de ânimo leve, porque se diz que se não pode ser feliz para sempre. E quando se diz que não agarrámos as oportunidades, agarramo-las todas, agarramos todas as possibilidades de não sermos felizes... Outros agarrarão, com toda a certeza, todas as oportunidades de serem felizes. E no fim, nem uns nem outros, desperdiçaram oportunidade alguma, apenas as aproveitaram de formas diferentes.

domingo, 12 de outubro de 2014

Chega

Chega um dia em que deixam de ser os princípios o meio para sermos quem somos. Chega um dia em que sermos quem queremos deixar de fazer sentido. Chega o dia em que o sofrer é inevitável e nem o conforto de se saber que se sofre para um bem maior é suficiente para acalmar uma dor que grita, calada num quarto fechado e escuro de olhos fechados. Chega um dia em que queremos deixar de sentir, chega o dia em que não queremos saber dos nossos princípios, nem dos nossos meios, nem de nós nem de ninguém. Chega um dia em que só queremos fazer parte da multidão, ser igual a toda a gente, O dia em que nos bastar ter o que os outros têm. Chega o dia em que nos sentimos de menos, chega o dia em que sabemos que não valemos a pena. E chega o dia em que só queremos desaparecer. E esse dia chega e fica... E há-de ficar para sempre. Porque quando se é marcado no coração o para sempre corre-nos no sangue até ao fim. Mas chega. Chega de tudo e chega de quase viver. Chega de lutar contra a evidência e contra a falsa verdade, chega de tentar viver o conto de fadas. Chega de acreditar no fim feliz. Chega... Agora é hora de deixar ir, de ser ser o que se for, de aceitar que se não há-de ser nada. Chega,,, Chega de acreditar e de sonhar... E chega de tentar ser diferente, é hora de não ser eu, é hora de ser o que querem que seja. Chega a hora de ser o que se espera, chega a hora de ser o que se pode ser. Chega de acreditar que a felicidade é uma coisa que vai dormir todos os dias à minha beira. Chega.
Já não sou papel branco onde se escreva, já não sou esperança onde se viva, já não sou felicidade que não foge. Chega. Não sou nada. Chega.

* E chega de escrever... 

sábado, 13 de setembro de 2014

Vendo ir

E às vezes é só assim... Um baixar os braços, um desistir, um deixar ir... E esperar que, de alguma forma, um dia, a vida lhe va piscar o olho e dizer "anda ser feliz"... E é com essa estranha confiança que vai continuando a viver como quem ainda não morreu... Mas, sabem os outros que aquele viver já não é de quem ainda vive, percebem que é um viver de quem ainda não morreu...

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Palavras leva-as o vento

Pediu-lhe baixinho que o ouvisse, pelo menos desta vez... Não é que desta vez o que tinha a dizer fosse mais importante que de todas as outras vezes, talvez fosse apenas porque sentia que aquele era o momento de dizer tudo o que havia a ser dito, como que se o que fosse dizer desta vez e mais uma vez, fosse ter um efeito diferente do que teve de todas as outras vezes... Esquecera-se, por aquele instante, que se não pode esperar reacções diferentes com a mesma "mistura de palavras" de sempre... Sentia de repente que pouco a pouco seria esquecido, sentia que nunca mais seria procurado, aos poucos sentia-se como se não mais fosse ser encontrado... A inquietude do esquecimento fazia com que a brisa que lhe varria o pensamento de quando em volta se transformasse numa tempestade de proporções nunca antes sentidas... As palavras voavam a uma velocidade incontrolável, o pensamento, esse, perdia-se nas palavras e não se encontrava na razão... Sentia como que, se não dissesse tudo agora, ficaria sempre à margem do coração, à margem da vida, à margem do tempo, à margem do mundo... E as palavras voavam soltas, sem direcção... Perdido em pensamentos e em palavras perdidas deixou-se ficar calado... E pediu-lhe baixinho, como quem já não tem força para dizer nada, como quem se perdeu no meio da tempestade, como quem deixa de acreditar no sentido e se deixa levar por um mar de emoções até bater num oceano de desilusões... "Não me ouças... Sente-me, não há nada que diga que faça mais sentido que sentir"... E sorriu, não havia muito mais a fazer que sorrir... E assim, assim se deixou levar pela tempestade carregada de palavras tontas... Palavras que a tempestade lhe arrancava do pensamento, pensamentos que se perdiam em gritos mudos, à margem do tempo, à margem da vida, à margem deles...

terça-feira, 29 de julho de 2014

E o tempo do tempo

Com o passar do tempo, vem o tempo certo, o tempo de perceber se fomos, se vamos ser, se devíamos ter sido ou ido... Chega o tempo certo de perceber se o caminho foi o certo ou o errado. Com o passar do tempo percebemos se vale a pena, se valeu a pena, se teria valido a pena.

Com o passar do tempo percebemos que aquele "Adeus" que nos demorou mais a sair era como que uma forma de percebemos que queríamos ter ficado Ou então percebemos que o "Adeus" se tornou mais prolongado porque se não sabia para onde ir. Ficamos apenas o tempo suficiente para deixar de ter medo de não haver outro sítio.

Com o passar do tempo vamos sentido o poder do querer, do sentir, o poder da vontade. vamos sentindo o poder da vontade de querer ter ficado ou ter ido, poder de não querer ter ficado ou o poder de não querer ter ido Com o tempo ganhamos o poder de decidir se foi bem ou mal escolhido e com este poder surge o peso da derrota do saber, do saber que deveria ter sido diferente.

Com o passar do tempo começamos a ganhar o poder de ser livres, presos ao que queremos, a quem gostamos e ao que gostamos e ao "onde" queremos estar. Com o passar do tempo percebemos que liberdade é poder ficar preso ao que é "nosso", ao que nos hão-de tirar sem querermos. Liberdade é aceitar que queremos e aceitar que nos pode ser tirado. Com o passar do tempo, liberdade é deixar ser até quando for. 

Com o passar do tempo ganhamos o direito à loucura, o direito a sermos quem não somos, o direito a sermos para quem nos conhece, completamente desconhecidos. Podemos, porque já sabemos quem somos e já sabem quem somos, podemos ir e depois voltar a quem somos, como se nunca tivéssemos sido "outro". E percebemos, com o passar do tempo, que a única forma de não enlouquecer é ser louco de quando em volta.

Com o passar do tempo percebemos que saudade é não fazer ideia do que se sente falta, é um perceber que com o tempo os dias se tornam maiores e o tempo deles não chega para nós e os dias vão muito depressa. Com o passar do tempo deixamos de querer saber, de querer entender. Com o passar do tempo deixa-se de querer saber onde se falhou, se falhamos realmente. Com o tempo começamos a ter saudades e não sabemos bem de quê e de quem, talvez os dias se tenham apenas tornado demasiado grandes e a vida pouco preenchida e pensar demais levou-nos a demasiadas recordações, do que foi, do que poderia ter sido, do que não foi e no meio de tanta recordação perde-se a noção do que foi real e do que queríamos que tivesse sido. Acabamos só por ter saudades de quem fomos e do que fomos noutra altura.

Com o passar do tempo começamos a aceitar o que não queremos, como que, se do preço a pagar pelo que queríamos ter e não conseguimos, se tratasse. Com o passar do tempo aceitamos que a felicidade foi desde sempre uma utopia, um sonho que se não concretizaria nunca. Com o passar do tempo olhamos em vota, para tudo o que queríamos ser, para quem queríamos ter e percebemos que não seremos nada, nunca... Que independentemente de tudo nunca seremos inteiros, que nunca nada nos completará. E, convencidos de que não podemos ser completos, tentamos encher-nos de nada e vamos tentando agarrar tudo e aceitamos não ser infelizes e viver, viver até ao fim. E com o passar do tempo, abrimos mão da felicidade e tentamos agarrar tudo o que de nós não faça miseráveis.

Com o passar do tempo deixamos que percebam que sentimos. que sentimos com profundidade, que gostamos intensamente, que nos arrancam pedaços quando nos magoam, que pedaços de nós ficam onde os outros nos deixam e aos poucos vamos ficando pequenos, muito pequenos, porque aos poucos todos nos vão deixando... Com o passar do tempo tudo parece demais e nada parece chegar.


Com o passar do tempo...

segunda-feira, 14 de julho de 2014

À medida

E à medida que o tempo passava questionava-se sobre e onde a vida o levaria. à medida que os anos iam passando iam ficando menos dias... Iam ficando mais coisas por fazer... As escolhas de um qualquer dia iam reflectidas pelo futuro em diante, um futuro que tinha cada vez menos dias, cada vez menos escolhas, cada vez menos opções, cada vez menos vida, cada vez menos magia, cada vez menos verdade... Não é que fosse velho... Ainda... Não é que se tivesse arrependido... Ainda... Mas já passaram muitos dias, muitas decisões, muitas dúvidas e demasiadas certezas incertas... À medida que o tempo lhe fugia da vida percebia que já não podia errar tanto, que já não podia alegar não saber das consequências... E o tempo, esse que nunca pára, esse de que tudo se lembra, esse de que dizem curar tudo... O tempo que antes parecia demais, hoje torna-se de menos... Errar já não é possível, viver o impossível já é só gastar dias... Continuar a sonhar é um gastar de horas... Acreditar na mentira é tentar enganar o tempo que nunca nos enganou, e que nunca se engana... À medida que os dias se tornam meses e as noites grandes em dias difíceis é tempo de parar, de ponderar, de decidir, de acreditar em alguma coisa, diz que à medida que os meses se tornam anos e os anos se tornam décadas fica uma vida para trás... Não fica mais nada, fica o que se fez, as decisões que se tomaram, as pessoas que se conseguiram cativar, ficam as oportunidades que nos fugiram, as oportunidades que deixamos fugir, as oportunidades que não pareceram sê-lo a tempo de o serem... Fica um corpo enrugado... E se os dias forem deitados fora, anos serão perdidos, vidas serão desperdiçadas... Agora, agora que ainda se podia questionar tentava perceber se o caminho que sempre tomara seria o correcto, tentava perceber até onde seria possível acreditar, ponderava parar... Parar para respirar, para perceber, para entender... Mas o tempo, o tempo dizia-lhe que se não podem perder dias, que um dia perdido é um pouco de vida não vivido... Lutando contra o tempo foi perdendo sempre, o tempo tinha sempre razão... As decisões de trás já lhe haviam ensinado que muitas histórias acabam de maneiras iguais mesmo com personagens diferentes e que as mesmas personagens poderiam acabar de formas diferentes... E enquanto o tempo passa e nos leva a vida com ele... Resta-nos tentar ficar com o que nos significará alguma coisa amanhã... Amanhã, quando o tempo nos provar que já não podemos continuar e teremos de parar... E ele, ainda que perdido no tempo e não encontrado na vida, procura o seu espaço... Um espaço onde o tempo se não atreva a entrar e a perguntar se valeu a pena... Um sítio seguro, onde se possa sentar a olhar para trás e agradecer todas as escolhas feitas... Procura-se a si numa vida que mais lhe não trará que a morte. E tenta encontrar-se, tenta encontrar-se nas decisões já tomadas, nas oportunidades já perdidas e na verdade... Na realidade que esteve sempre à sua frente escondida... À medida que o tempo passa não nos restam anos, restam-nos dias... E à medida que os dias lhe parecem menos só quer viver de verdade, não quer viver de mentira, do que não é... Quer viver... E se ser feliz lhe parece impossível, tenta pelo menos ser ele próprio agora... E por um breve momento... E o tempo que se diz nunca parar, de quando em volta pára para lhe ver o sorriso no rosto, o sorriso de quem conseguiu aqui e acolá ser feliz para lá do tempo, para lá do espaço... Para quem conseguiu viver um momento, para quem durante um bocado conseguiu ser perfeito. E esses momentos só são verdadeiros e reais quando partilhados... E ele sentia-se assim, completo e inteiro de quando em volta... E diz-se que seria assim até ao fim, até quando o tempo se não lembrasse mais e o deixasse ir sossegado, sem lhe colocar mais dúvidas e mais incertezas e o deixasse ser até sempre...

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Fica o que seria

Um dia, enganado pelo seu próprio sonho e enganado pela errada ideia de que podia controlar o seu futuro, deixou-se ir, acreditando que conseguiria sempre guiar a sua vida através do sonho que um dia imaginara. Crente em todos os ideais que julgava ter, confiante nos princípios que lhe haviam dito ter foi caminhando, a medo... às vezes... Convicto noutras tantas foi sempre... Foi sempre até onde julgava ser possível. E até ali, onde um dia percebeu que às vezes os sonhos são pequenos quando se encontra algo tão maior e não mais pequeno que o amor, o amor sincero, o amor sem limites, o amor em todo o sentido da palavra, Palavra essa que um dia também lhe haviam explicado o significado. Explicaram-lhe, mas nunca lhe explicaram que o amor, por si só era um sonho, um sonho de dois, um sonho muito maior do que qualquer sonho que pudesse alguma vez perseguir sozinho. Ainda confiante nos seus princípios e ideias, deixou-se levar pelo amar, pelo gostar, pelo querer estar. Por não querer estar em mais lado nenhum... E de pés bem firmes no chão deixou-se voar, deixou-se ir pelo que era tão maior que ele. E mesmo depois de conhecer "amar" continuou, convicto, ainda mais convicto, de que seria feliz e poderia partilhar essa felicidade. Não estava sozinho, sonhar já não fazia sentido, agora podia viver. E, nunca deixando de amar, mas também nunca abandonando quem sempre fora foi destruindo o amor, aos poucos, foi-o diminuindo, acreditando que seria sempre maior que tudo. E mesmo depois de lhe terem explicado tudo, mesmo depois de ter percebido como era, nada o impediu de o perder, de perder o amor. Nada o impediu de se perder do sonho, do amor, de si, de tudo. Restava-lhe pouco agora, pouco mais que voltar a começar, que voltar a sonhar, que partir de onde, afinal, nunca havia saído. Agora, embora triste, embora desmotivado, embora sem acreditar, sabia que havia sempre algo maior, algo que seria sempre mais que a vida, ou que duas. Sabia que podia sonhar, que podia amar e que podia voar... Mas ao longo da viagem foi percebendo que amar não se escolhe e sonhar não mais é que uma ilusão. Ao longo da viagem percebeu que foi ali que se perdeu de si, do sonho, dos ideais e dos princípios. Solto de tudo, perdido de si... Vagueou... Não se sabe se voltou... A si... Não se sabe se voltou a sonhar, só se sabe que viveu e sabe-se também que provou o mais doce dos sentimentos. sabe-se que a partir dali nada foi tão doce como seria. Tudo lhe pareceu mais azedo, mais pequeno, mais nada. Dali em frente sabia que se perdera para não mais se encontrar. Restava-lhe vaguear e acreditar, acreditar que um da as recordações lhe encheriam a memória e que um dia seria feliz só por recordar tudo o que poderia ter sido e não foi. Um dia sentado... Ouviria a sua música e tê-la-ia ali tão perto. 

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Partir

Às vezes partimos de nós, deixamos quem éramos numa mala e escondemos no sótão e esperamos que nunca ninguém nos encontre. Ele partiu naquele dia, no dia em que achou que havia chegado a altura de largar tudo e ir atrás de outra coisa qualquer. Fechou-se na mala e deixou outro "eu" dele sair, um "eu" que nunca foi ele, mas que a partir daquele dia teria de ser. Um eu que aceitara perder tudo para sempre, e que voltaria a conquistar-se a si e a tudo noutro dia qualquer. Seria como que transformar toda uma vida em coisa nenhuma e fazer de conta que o passado nunca foi dele. Julgava ser possível abandonar tudo o que fazia dele quem era, as pessoas, as ideias, os princípios, os pensamentos. Tudo lhe parecia fazer sentido naquele dia. O que ainda não tinha percebido é que podia largar tudo, podia recomeçar sem ninguém, poderia voltar a ser nada. O que nunca conseguiria era ser feliz, nunca conseguiria ser inteiro sem aqueles que fazem dele quem ela, sem aqueles que lhe conhecem todos os erros e conseguem ainda olhar para ele sem pena. Desistiu de si, dos outros, desistiu de tudo e queria voltar como um herói derrotado e voltar a ganhar tudo o que julgava poder ter perdido. E tudo mais não foi, afinal, que uma vitória com cheiro a derrota, quando julgava ir de encontro ao início de um capítulo novo, deu conta que poderia estar de frente com o princípio do fim, do fim dele. Aquele morrer devagarinho e sem esperança, aquele ir desaparecendo daqueles que o fazem aparecer como um herói. Sabia poder perder-se e sabia nunca poder encontrar-se. Agora restava-lhe esperar, esperar que desistir nem sempre fosse uma derrota e que desistir, apesar de não ser vitória, não fosse um perder tudo. Esperou e esperará até ao fim. Já era tarde para voltar atrás e ainda não era tempo de ir para a frente. Sabe que partiu inteiramente naquele dia e apesar de voltar partido, ainda tinha em si a esperança de que alguém o salvaria de si e do outro "eu" que inventara. Agora caminhava a passo incerto, sem nunca pisar chão que o segurasse...

domingo, 8 de junho de 2014

Para sempre

E depois vem a vida... E ensina-te que tudo o que queres não é teu, que por muito que lutes nunca terás o teu sonho, que por muito que corras não alcanças essa felicidade. E depois vem o dia em que decides desistir de tudo, o dia em que não queres saber, o dia em que dizes que dali em diante será sempre a perder. E depois vem o dia a seguir, o dia em que percebes que tudo o que não tinhas seria sempre maior do que aquilo poderás vir a ter, o dia em que não ter era melhor que ter outra coisa qualquer. E agora é sempre tarde demais, porque tudo o que não tinhas, era só isso, o que não tinhas e agora, agora sabes que nunca terás... E assim terás de viver, sem nada, para sempre. Desisti ontem de hoje e amanhã.

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Saber

"Encostei-me a ti,
sabendo que eras somente onda.
Sabendo bem que eras nuvem
depus a minha vida em ti.
Como sabia bem tudo isso,
e dei-me ao teu destino frágil,
fiquei sem poder chorar,

quando caí."


quando se sabe... é como se nunca se quisesse saber!

quinta-feira, 29 de maio de 2014

E os dias vão assim!!

"Suspiro a cinzento escuro, nestes dias. Tenho o céu todo a trovejar nos olhos.É muito cinzento, mesmo para um amor daltónico. Cansa-nos a alma mal ela acorda.
Não lhe dá espaço para rasgar um ou dois vincos de riso.
Nada.
Arrasta-nos para o fundo do mundo.
Quando era (ainda) mais novo adorava estes dias. Estava intimamente ligado com o facto de não haver aula de educação fisica. E isso enchia-nos de coisas para fazer. Mesmo à custa de nunca as virmos a fazer.
Hoje em dia, mais precisamente hoje, desmancha-me. Vento, chuva e frio não alimenta muita esperança aos olhos.
Pelo menos aos meus.
Dá vontade de esconder o dia de toda a gente e esticar as pernas numa casa de janelas cimentadas.
Os dias cinzentos têm esse duro dom de descansarem uma lupa sobre o que quer que nos doa peito adentro.
A lupa é tão grande...
Que venha o sol, nem que seja por um quarto de hora, para nos lembrar que há vincos na alma."

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Até ao fim

Nunca se sabe até quando se lembra o que se não pode esquecer. 
Nunca se sabe quando é que o tempo dá o último golpe na memória 
de quem se perde no espaço e se vai encontrando no tempo passado. 
Agora, que ainda me lembro e ainda te posso dizer quem sou, ouve o
que tenho para te dizer. Antes que um dia partas na memória como 
quem parte num sonho há muito construído, antes que deixes de ser
a luz que apaga a noite lá fora e guia os que vagueiam sem destino,
antes que o tempo e o espaço se confundam com sonho e realidade,
antes que a vida te torne numa sombra sem rosto, antes que a vida e
os caminhos nos troquem os dias e as vontades e as memórias e os 
momentos, antes que os medos de nós nos atropelem numa qualquer 
rua mais escura de dia, antes que sejas passado sem presente e futuro
apagado, antes que... Antes que o fim se tente impor no que seria para
sempre deixa que diga que o fim é uma miragem e o tempo é um 
caminho sinuoso e íngreme numa viagem atribulada e sem destino 
adivinhado. Deixa que te diga que tudo o que se construiu se não 
pode perder na viagem, porque já és caminho, já és casa, já és eu
e todos os momentos em que te caí nos ombros cansados do mundo 
serão para sempre nossos e as marcas que ficam em mim serão sempre 
tuas, mesmo que não tenhas rosto e te percas nas memórias, no tempo. E
mesmo que vida te leve para longe de nós serás para sempre... até ao fim.

domingo, 11 de maio de 2014

Nunca se perde inteiramente

Quando o mundo se juntava para o derrubar fazia-se rodear das pessoas que lhe seguravam o mundo... Os seus pilares... Enquanto aqueles pilares, os que sempre o sustentaram e sempre o apoiaram e nunca o questionaram, o aguentassem não perdia, não se perdia... Era neles que se tentava segurar, eram eles que lhe diziam calados quem era. E mesmo quando tudo se julgava perdido respirava fundo, perto daquele ou daquela que um dia poderia ir, mas que ainda ficava e ficaria para sempre mesmo que fosse. Era como que se na calma deles encontrasse o próprio equilíbrio, num mundo falso de vaidades e de mentira, de invenções e desilusões. Era o estar aflito e aos poucos ser abalroado por uma calma que lhe dava força para mais um dia. E enquanto assim fosse diz-se que aguentaria uma vida ou duas. Enquanto todos os que o julgavam ter derrubado o achavam, ele recuperava perto daqueles que se não importam de se entregar como derrotados por uma vitória maior. A vitória da amizade, do amor, do que é verdadeiro... E enquanto os outros, aqueles que não sabiam o verdadeiro sentido de poder sossegar abraçado a alguém que só sossegaria depois de o respirar ser possível sem esforço e pesar, julgavam ter ganho mais uma batalha, ele sabia que tinha ganho um bocadinho mais de amor, de esperança, de vida, um bocadinho mais de alegria. E depois, um dia, quando todos o julgassem destruido, todo ele era reconstruído de coisas verdadeiras, de momentos perfeitos, de lágrimas sinceras, de alegria inquestionável. E enquanto assim fosse ele e os outros, os que com ele seguravam mundos e destruíam pesadelos, poderia sonhar todas as noites. Podia sonhar em ser feliz e poderia julgar-se intocável, inteiro. Podia julgar-se "invicto" ele e os que se deixaram perder para poderem ganhar.

sábado, 3 de maio de 2014

Nada...

E os dias, que caem um atrás dos outros, seguidos de noites que se prolongam e se perdem. Perde-se vida, perde-se tudo, perde-se tudo o que se teve e não se ganha o que se ganharia. Em troca da efémera sensação de liberdade de 2 copos cheios de vazio, vistos por dois olhos embriagados que nada vêem, acordamos ao outro dia com o nada que se adivinhava e presos à consequência do vazio. E os dias são só isso, uns atrás dos outros e tudo se perde a cada dia, nada se ganha e a cada noite tudo se perde. E ele, ele ainda julgava que ganhava alguma coisa, foi então que acordou, vazio, cheio de nada do dia anterior e cheio de tudo o que viria a seguir. E assim seguiu, como seguem os que vão andando ao sabor de nada. 

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Vasco Graça Moura

"quando eu morrer murmura esta canção
que escrevo para ti. quando eu morrer
fica junto de mim, não queiras ver
as aves pardas do anoitecer
a revoar na minha solidão.

quando eu morrer segura a minha mão,
põe os olhos nos meus se puder ser,
se inda neles a luz esmorecer,
e diz do nosso amor como se não

tivesse de acabar, sempre a doer,
sempre a doer de tanta perfeição
que ao deixar de bater-me o coração
fique por nós o teu inda a bater,
quando eu morrer segura a minha mão."

O mundo fica mais pobre...



domingo, 27 de abril de 2014

Talvez

Debruçara-se naquela que não foi a sua varanda de sempre. Descansava o corpo atirado contra o muro, todos os dias o mesmo atirar, todos os dias o mesmo corpo cansado. Longe já iam os dias em que se enconstava pelo prazer de um cigarro à leve brisa que lhe empurrava o sol pela face. Ao fundo todo um mundo, um mundo todo ele novo, que já há muito conhecia mas que todos os dias lhe provava ser sempre diferente, sempre novo. Não se sabe do cansaço, se de ter deixado de prestar atenção a tudo o que era novo no velho mundo de sempre os cigarros eram como que leves passageiros numa pesada brisa que já não conseguia empurrar o sol. Dali, da varanda que não foi sempre a mesma tudo lhe parecia igual. De corpo caído e sem força avistou nada. E como seria bom ser nada, passar de leve pela vida como se a vida fosse pouco. O bom que seria poder acordar todos os dias e esquecer ontem amanhã. Passar pelas pessoas, imune aos seus julgamentos, aos seus pensamentos pequenos, passar como passa tantas vezes a brisa que tudo com ela carrega e ninguém percebe. Talvez fosse o olhar que se já não prendesse com a mesma facilidade, talvez fosse a varanda que já lhe não chegasse. Não se sabe... Sabe-se só que, cansado, ainda não mudava a varanda, só mudava os cigarros por uma questão de efemeridade. Já há muito que não se lhe vê o corpo como que deitado na varanda e mesmo o vento se faz passar mais fugaz por aquele sítio que já recebeu tanta luz. Talvez tenha mudado de varanda e com ele tenha levado a luz que ali o encontrava. A paisagem, essa continua igual ao que sempre foi e lá ao longe tudo é diferente todos os dias, não se podia cansar, só podia estar cansado. Talvez tenha ganho força e tenha ido para onde o mundo não era igual ao que sempre fora. Talvez... E nunca se sabe o que traz cada varanda e nunca se sabe o que leva cada brisa.

sábado, 26 de abril de 2014

Diz-se que.

Andava perdido, sempre perdido, dele dizia-se nunca se ter encontrado. O tempo não o encontrava, os sítios, pelo menos os que se diziam como os certos perdiam-se dele. Às vezes cruzava-se com o sítio certo, mas o tempo teimava em dizer-lhe que não era. Os sítios a que chamava seus iam-se perdendo no tempo, o tempo, esse por sua vez arrastava-o com ele sempre. Mesmo que não fosse e ficasse o tempo passava e ia sozinho sem ele. Ele ficava quieto naquele que queria que fosse o sítio certo. Outras vezes o tempo levava-o para onde não pertencia, ou levava-lhe o "aonde queria estar" para longe. O tempo, à medida que ia passando por ele, ensinava-o que tinha de ser onde estava, que não valia a pena correr atrás de outro sítio. Ensinou-lhe que nem sempre o cenário é perfeito, às vezes é bom que não seja. o tempo não lhe dava tudo e ameaçava-o constantemente que lhe ia tirar tudo. Na altura certa estava no sítio errado e no sítio certo estava na altura errada. Desencontrado dizia-se. O tempo dizia-lhe que "a seu tempo as coisas correm bem no sítio errado e correm mal no sítio certo". O tempo, sempre o tempo a dizer-lhe, dizia-se. Mas o tempo nunca lhe disse nada. Um dia, quando o encontraram, perceberam que não foi o tempo que lhe disse, mas sim o "sítio" onde esteve que lhe ensinou tudo. Dele, que disseram perdido, encontraram sabedoria. A ele perguntavam-lhe tudo. E ele não era o tempo, mas sabia. E até sabia mais que o tempo, porque o tempo não sabe nada. O tempo passa só, calado. Não se dá por ele. O tempo não existe, ele ao menos existiu! Não se sabe onde, nem quando. Mas foi. Foi o que pôde ser, num sítio onde não poderia ter sido outra coisa. Ele tinha todas as respostas, as suas respostas. E um dia, num dia qualquer, sabe-se que o tempo lhe não perguntou nada. E ele respondeu-lhe que foi muita coisa além do que foi naquele sítio, disse-lhe que viveu em muitos mundos que e que o tempo o não controlou! O tempo não conhecia os outros mundos, só conhecia aquele. E foi por ter ficado que não foi. Foi por ter ido que gostava de ter ficado. Foi por não fazer nada que quis ter feito. Foi por ter feito tudo que quis ficar quieto. E o tempo... Esse... Esse passava sempre com o passo certo e acertado como os ponteiros de um relógio. Nunca saiu dali, daquela rotina de dias que se tornavam anos, que se tornavam séculos. A memória do tempo era fugaz e não conhecia mais nada além do agora. O tempo nunca soube nada, o tempo é que estava perdido. E ele perdeu-se no tempo não se sabe onde. Pode ter sido em qualquer sítio, pode ter sido em qualquer "agora".

quinta-feira, 24 de abril de 2014

The time is now

Hoje sentamos aqui, bebemos ali, aproveitamos tudo o que há para aproveitar ali, rimo-nos aqui, em casa, rimo-nos ali, com aqueles que gostamos, que são de casa... Hoje vemos um filme, hoje ouvimos uma música, hoje brincamos, hoje corremos, hoje jogamos, hoje bebemos até ser amanhã, hoje vivemos, hoje aproveitamos, hoje... Agora... Amanhã, amanhã seguimos com a vida para a frente, amanhã traçamos planos, amanhã poupamos, amanhã é outro dia, amanhã recompensamos, amanhã corrigimos, amanhã vamos levar as coisas a sério, amanhã abraçamos o futuro, amanhã lutaremos pelo melhor futuro, amanhã pensamos... Hoje, hoje podemos aproveitar só, hoje podemos viver sem culpa, hoje podemos correr sem objectivos, hoje podemos beijar o nascer do sol, podemos beber da fresca aurora que se avizinha, hoje podemos adormecer com a manhã e a acordar embalados pela doce confusão que se faz lá fora, pelas pessoas que vivem amanhã. Hoje podemos ficar aqui só, quietos, abraçados, hoje podemos ficar aqui a contar histórias até adormecer, hoje e só hoje podemos viver o que nunca será amanhã. Amanhã, amanhã voltamos à vida, amanhã voltamos à rotineira e confortável monotonia, amanhã seremos o que nunca seriamos hoje, amanhã... Os que vivem hoje vivem intensamente, aproveitam cada momento como se fosse o último. Os que vivem amanhã aproveitam uma vida inteira. Talvez. Mas há momentos, breves... Muito breves, podem durar segundos. Mas são uma vida inteira. E viver, viver é hoje, porque morrer é sempre depois. E enquanto o sol te brilhar na cara, enquanto o vento te soprar ao ouvido, enquanto a água te corre fria pelos pés, enquanto a vida te acorda todos os dias, enquanto sentes a Primavera, enquanto sentes a areia quente debaixo de ti, enquanto tudo isso acontece, tu vives, vives como não viverás amanhã, porque amanhã já não é o mesmo sol, não é a mesma água, não é a mesma Primavera, não é a mesma areia... ontem foi amanhã e agora é apenas mais uma paragem passada na viagem, hoje é amanhã que depois serão menos uma quantas paragens. E à medida que se vai viajando percebe-se que o que nos prende à vida são momentos. É o agora! Ser feliz será algures aquele espaço que fica entre há bocado e daqui a bocado. E, se formos plenos, se formos inteiros em cada momento, se formos coerentes com a razão, seremos felizes ontem e o ontem é o que fica para amanhã.

domingo, 20 de abril de 2014

Verdes, as cortinas

Encontraram-se pela primeira vez, pelo que se lembra o tempo, num quiosque de uma estação de autocarros. Ambos à procura de alguma coisa que lhes ocupasse as mãos e o pensamento durante a viagem, como que se conhecessem a viagem tão bem que a paisagem já lhes não trouxesse nada de novo, se calhar fizeram muitas vezes a mesmo viagem, mas sozinhos. Eram dois, cada um a seu canto, e talvez um dia fossem eles um só no mesmo canto (há coisas que se sentem e não se sabe). A medo aproximou-se dela. Falaram durante algum tempo. E agora? O que vem agora? O que acontece depois do inicio, onde será suposto chegarem? Ainda eram apenas dois desconhecidos e já teriam mil cenários possíveis. Pediram um café. No espaço entre o café e o virar de duas folhas de jornal poderiam ter sido tudo, poderiam nunca ser nada. Foram, durante este bocadinho, alguma coisa, dois desconhecidos que se cruzaram por acaso. Enquanto mexia o café perguntou-se como seria o próximo encontro, como seria a próxima viagem, como seria a primeira casa, como seriam todos os dias, como seria uma vida inteira.. Viram-se os dois, viram o que seriam, viram o que não seriam, viram tudo o que poderia haver um no outro. Ficaram, os dois, com a nítida sensação de que a vida é uma festa e que nunca se sabe quando acaba. Restava-lhes viver aquele bocadinho como se fossem um só que nunca seriam. Viveram um Domingo à tarde, daqueles que demoram a passar, daqueles em que um cobertor envolve dois corpos e os leva a passear até ao passado, bem agarrados para se não perderem, abriram uma garrafa de vinho enquanto a lareira lhes aquecia os pés, que a alma já estava quente. Ainda era Domingo, por ali se deixaram ficar, chovia lá fora. Quando o início chegou ao fim e o autocarro se aproximou para os arrastar por mais uma viagem, foram cada um para o seu canto. Viveram ali, naquele bocadinho, tudo o que tinham a viver, não havia mais possibilidades, não havia nada que os pudesse surpreender. Teriam assim uma vida... perfeita... Acabou tudo ali, naquele início, perceberam os dois... Entraram para o autocarro e sentaram-se um ao lado do outro. Tudo aquilo que imaginaram podia não fazer qualquer sentido, poderiam ser qualquer coisa, poderiam não ser coisa nenhuma, mas ainda não se conheciam, e nunca se sabe o que esperar de alguém que faz da realidade um misto de sonho e magia. Deixaram-se ir juntos, diz o tempo, que se deixaram ir assim para sempre e nunca souberam para onde iam. Nem se sabe se têm cobertor para os embalar pela vida! Mas agora viajavam juntos e e sabiam que o mundo era infinito!! Será que as janelas têm cortinas verdes?

Da vida para sempre (Gabriel Garcia Marquez)

"(...) enfrentei pela primeira vez o meu ser natural enquanto decorriam os meus noventa anos. Descobri que a minha obsessão de que cada coisa estivesse no seu lugar, cada assunto no seu tempo, cada palavra no seu estilo, não era o prémio merecido de uma mente ordenada mas, pelo contrário, um sistema completo de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, mas como reacção contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir a minha mesquinhez, que passo por prudente por ser pessimista, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que não se saiba que pouco me importa o tempo alheio. Descobri, por fim, que o amor não é um estado de alma mas um signo do Zodíaco. "

Ficas para Sempre! 

sábado, 19 de abril de 2014

Mais uma noite, mais uma aventura talvez!! De início ia a medo a meio ia com muito mais medo ainda!! Não é fácil viver num mundo onde se quer agradar a todos e ele sabia-o, tarde demais talvez... No fundo nunca se respeitara, respeitara sempre os outros acima dele. E com esse respeito a única coisa que ganhava era mais medo ainda... Um dia, numa tarde quente e cinzenta de Verão desnorteado cruzou-se com ela, cheirava a flor de mar, aquela combinação de doce com salgado, sabia-o antes de se aproximar dela. Ao aproximar-se perdeu-se, ela vivia livre, livre dos julgamentos dos outros, vivia para si e depois para os outros, construiu-se para poder construir nos outros! Ele, ainda a medo, deixou-se ir, perdido, sem perceber onde iria este caminho levar. Estava fascinado com a complexidade daquela simplicidade... Foi sempre assim a medo e sabe-se que se foi embora antes de perceber o que era tudo aquilo! O medo mais uma vez havia vencido, restava-lhe agora ser forte para uma outra vida... Uma outra vida que tinha medo de encontrar... Não se sabe se foi sempre assim, tinham medo de lhe perguntar, porque tinham medo que tivesse medo de responder. Havia perguntas para as quais as respostas não estavam preparadas, havia respostas que ainda não tinham perguntas preparadas. Foi aí que percebeu que o medo não fazia sentido e as respostas não surgem sempre depois das perguntas e a morte não surge sempre a seguir à vida! A morte surge a cada vez que o medo vence a vida. Não se perguntou, limitou-se a ficar com esta resposta, com medo de que a seguir a esta pergunta viesse outra.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Como que em tom de despedida, como quem percebe que construiu um mundo aonde não pertence fugiu, com o falso pretexto de que ir seria a melhor saída para quem nunca chegou a entrar... Fugiu, como que se ficar fosse condenar a chegada que nunca o chegou a ser... À medida que corria percebia que queria ficar e à medida que se ia afastando percebia que só queria ter ficado... E foi... Foi sempre, porque ir era não ficar, era não ser... Não se sabe se chegou a ser, só se sabe que nunca foi!!

Este blog merece melhores dias, em tom de "até já" e de respeito por quem se habituou, me despeço dos que me seguem!! "até já"!!

terça-feira, 15 de abril de 2014

Vivia assim... Como quem não vive! Todos duvidavam dele, mesmo quando parecia fazer sentido... Muitos havia que o ouviam, que o viam e que o tentavam viver, muitos se agarravam a ele, como que se fosse a última, a derradeira, esperança, a esperança que fazia com que continuassem a suportar a realidade tantas vezes fria, sem cor, tantas vezes cruel, tantas vezes injusta... Era quase como um acreditar por falta de uma opção melhor. Havia outros que até eram felizes e se prendiam a ele também de quando em volta, fazia-os voar, fazia-os viver o que nunca seria, levava-os onde nunca ninguém poderia ir e trazia-os de volta a casa... Com ele muitos voaram livres como nunca seriam, presos a uma realidade pesada que não permitia sequer pensar em depois de amanhã. Por onde passava deixava um sorriso no rosto, um sorriso calmo, sereno, um sorriso de que nem tudo estava perdido e ainda tudo era possível. Mesmo assim, era visto como uma aberração, como um absurdo... Às vezes passeava os que não andavam por verdejantes campos e magníficas quedas de agua, mesmo esses passados breves momentos, estremunhados por uma queda de quem não podia andar e tentou, gritavam com ele. Sentia-se pequeno quando fazia tão grandes momentos. Sentia-se oprimido pela realidade, sentia-se esmagado... Era como que apenas fosse um refúgio quente dos que passam frio. Era como que um abrigo para os que apanham a chuva na face. Dizia-se que era uma casa para aqueles que perderam tudo. Dizia-se que trazia de volta os mortos e que os conseguia fazer voltar a viver. Fazia com que o passado voltasse e se alterasse todo o futuro! Às vezes esforçava-se tanto que conseguia criar mundos surreais, belos, perfeitos, utópicos!! E mesmo assim todos o olhavam como um destruidor de felicidade. como que se além de ter feito um pobre desgraçado e sem esperança viajar até onde poderia ir se acreditasse nele, fosse obrigado a ir com ele, de mãos dadas, como que a traçar-lhe um caminho que nunca devia ter esquecido. Muitos, depois de se terem cruzado com ele, desejaram que nunca o tivessem encontrado, outros tantos ficavam gratos. E nunca ninguém ficava, vivia sozinho para os outros, sem pedir nada em troca. Existia só e deixava de existir no momento a seguir. Muitos lhe chamavam sonho, muitos lhe chamavam pesadelo... E ele nunca foi mais que nada, nunca foi mais que um conselheiro que ninguém ouvia e mesmo assim, de quando em volta voltava, para tentar acordar aqueles que adormeciam à sombra de uma realidade que não tinha de ser real. 

domingo, 13 de abril de 2014

Para sempre

Dançava sob o olhar atento da lua, os seus movimentos eram livres e deixavam-se levar pelo sabor do vento, porque o vento soprava de acordo coma sua vontade. Até a lua conseguia ver a alegria que carregava no olhar, aquela alegria de quem sabe que sempre foi ao sabor da vontade e de que nunca nada a prendeu, nem a própria lua, que sempre a vigiou, lhe chegou a prender a imaginação. E quando a sua encantada brisa sopra à alma de um qualquer distraído, por um breve momento que poderá durar para sempre, dança-se ao sabor do luar e à sua vontade. E é neste dançar quase que inocente que se morde a felicidade, é neste breve instante que se promete querer ficar para sempre. 

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Estar onde não ser

Num qualquer dia diz-se que se apercebeu... Vivera muito tempo iludido pela realidade que se esquecera da razão da imaginação... Ou seria ao contrário!? Às vezes esquecia-se do seu lugar, colocava-se em sítios que não era seus, pelo menos não seriam durante muito tempo e na realidade... Parecia-lhe que seriam eternos. Outras vezes saía de onde pertencia para estar aonde nunca seria... Vivia realmente o que nunca viveria, como que se já tivesse sido o que nunca foi... Por vezes julgavam-no perdido num mundo que não era igual aos outros... Talvez não fosse, o mundo é cheio de coisas que são e de outras que nunca serão... O mundo dele é cheio de coisas que não são e sempre foram e cheio de coisas que são e que nunca seriam... Por vezes chamavam-lhe louco, mas no seu mundo diz-se que ser louco é uma opção, como no mundo dos outros viver também o é. Ser louco seria ser mais ou ser menos, mas seria não ser igual aos seres dos outros... Às vezes fazia sentido e ficava onde não era... Outras vezes não fazia sentido sair de onde estava e ia... Às vezes voltava, mas nunca voltava inteiramente... às vezes ficava de onde não era para perceber quem seria, se ser não fosse como é... Mas nunca ficava "para sempre" porque não se pode ficar para sempre de onde se não é... Diz-se que foi assim, não se sabe se foi quem quis ser, não se sabe se não foi quem realmente foi... Foi sempre uma folha em branco cheia de coisas que nunca seriam, era uma folha cheia de coisas que sempre foram e nunca chegaram a ser... E por fim foi uma história sem fim, porque quem nunca foi e conseguiu ser merece viver para sempre aonde não é... 

sexta-feira, 28 de março de 2014

viagem

Muitas vezes não percebia se miragem era o rio se a margem, apenas se sabe que do rio fez a sua viagem...

terça-feira, 25 de março de 2014

Em P3

"Não faço anos hoje, nem amanhã nem sequer para o mês que vem. Ainda assim, há aniversários a toda a hora à minha volta e, como diz o povo, ninguém está a ficar mais novo. Eles, como eu, estão a aproximar-se perigosamente dos trinta anos – aquela idade que, em miúdo, achava eu que já se estava acabado para a vida. Que já se começavam a fazer os planos para a reforma. Que ter trinta anos era a fronteira da estabilidade: a partir daqui, cuida-se dos filhos, entra-se às nove e sai-se às seis e os dias pouco passam disto. Naturalmente, estava redondamente enganado.

É certo que os tempos mudaram demasiado desde o início dos anos noventa para cá, mas hoje, chegar aos trinta parece-me o maior desafio das nossas vidas. É a era do tudo ou nada. Em que olhamos para trás e as conquistas nos parecem sempre poucas. Apontamos, por isso, os binóculos para a frente e observamos as miragens das ambições de sempre. Se não for nesta década, dizemos ingénuos a nós mesmos, podemos esquecer. Aos quarenta já se é velho para ter sucesso, julgamos.

Chegar aos trinta é um inchar peito à espera que as balas não nos acertem. É tomar fôlego apesar de não haver muito oxigénio ao dispor de quem tenta inspirar. É achar que os anseios e desejos hão-de tocar à campainha sem ter de esperar muito para que lhes abramos a porta.

Chegar aos trinta é temer o falhanço e, ainda assim, fazer uma lista do que ainda se espera. Como se fosse a derradeira década. Quero filhos, quero emprego, quero dinheiro, quero sucesso, quero ser amado, quero ir às ilhas Virgens, quero descobrir a fórmula da Coca-Cola, quero compor um “hit” mundial, quero escrever coisa mais bela que o Cântico dos Cânticos, quero marcar golos melhores que o Ronas, quero ter a minha cara por toda a Nova Iorque. Quero, quero, quero. Menos que isto é zero.

Chegar aos trinta também é assistir às primeiras cedências anatómicas. É ver os cabelos agarrar na trouxa e partir para longe. Os que ficam decidem fazer um “extreme makeover” e, aos poucos, empalidecer. Aqui e acolá, mais um branco para a colecção. É também perceber que a gravidade é a força mais poderosa do universo e que a flacidez também pode ter o seu quê de belo. Chegar aos 30 é um relembrar de que a idade é o temporizador da não existência: quanto mais avança, menos falta para se ir desta para melhor.

Chegar aos 30 é ver alguns amigos já casados, de recém-nascidos nos braços, mostrando ao mundo que os projectos de vida são reais e, embora nunca sejam lá muito planeáveis, são verdadeiramente realizáveis. É ver que à nossa volta, o que sobra são os solteiros exigentes e os pavores do compromisso. É apreciar as evoluções e conquistas dos nossos mais íntimos com sincero orgulho e secretíssima inveja.

Chegar aos 30 é saber que já muito se fez e que muito há ainda por fazer. É praticamente o meio-termo entre a loucura da juventude e a circunspecção da vida adulta. Acima de tudo, chegar aos trinta é não querer ter os trinta de mais ninguém."

http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/11356/chegar-aos-30

segunda-feira, 24 de março de 2014

Talvez

Antes sonhara toda a vida. Imaginara como seria o amanhã e o depois e o entretanto... Imaginara todas as conquistas que alcançaria um dia. Imaginava uma vida perfeita, uma vida única, julgava ter a capacidade de ser diferente de todos e adorado por outros tantos... À medida que os dias que um dia imaginara se lhe esbarravam com a vida começou a perceber que talvez tudo o que imaginou mais não era que o que toda a gente imaginara também... Lá atrás, onde sonhava de olhos abertos, julgava-se diferente e no fundo nunca foi diferente... A diferença talvez fosse que nunca partilhara o seu mundo com ninguém, os seus sonhos, os seus objectivos e como se dizia já há muito, um sonho que não é partilhado mais não é que isso mesmo, um sonho... Os dias iam passando e ia coleccionando derrotas, leves, pesadas... Das vitórias todas que tinha imaginado juntou derrotas e à medida que o tempo ia passando as derrotas pequenas quase eram como vitórias... Agora, de cada vez que viajava para o futuro mais não via que derrotas, cada vez mais derrotas, cada vez mais igual a todos, cada vez mais incapaz de ser diferente... Talvez um dia, mais lá para a frente o futuro o voltasse a surpreender e em vez das derrotas já imaginadas e quase vividas chegassem inesperadas vitórias. Talvez... O tempo, esse que se diz tudo ensinar a quem lhe conseguir resistir, ensinou-lhe que não se pode viver para a frente nem para trás e que o "dia mais importante da história de cada pessoa é hoje", talvez um dia aprenda a não viajar para onde não se sabe... Talvez não venha a ser feliz.. Talvez... Mas por enquanto, por enquanto mais vale não ser já infeliz... Talvez...

quarta-feira, 19 de março de 2014

"Onte"

Ver demais é um problema de visão mais grave que qualquer outro, ou outro qualquer... Não há ainda solução para aqueles que vêem para além do horizonte, não há ainda quem nos consiga fazer parar de olhar para lá de "onte"!!

domingo, 16 de março de 2014

Vai vento que a tempestade é uma criança

Vivia ao sabor do vento!! Diziam todos os que para ele olhavam com olhos de quem vê passar uma estrela cadente lá no horizonte... Os que viam mais de perto percebiam que às vezes o sabor do vento lhe dava vontade de ir contra ele. Às vezes quando tudo seria mais simples deixando-se levar impunha-se e tentava contrariar a corrente, de nada poderia valer para o mundo, mas fazia-o sentir-se solto no seu... Livre de correntes que prendiam os outros todos ao chão. Às vezes bastava-lhe perceber como seria a vida se a vida não fosse assim! às vezes sentia que tudo seria de uma outra forma qualquer, mas logo percebia que era assim porque os ventos nem sempre levam a sítios seguros e nem sempre levam a tempestades inultrapassáveis... Ficava ali, no meio, entre a felicidade e a tristeza, era como que estar no meio de um rio e olhar para as duas margens e não perceber para onde se devia remar. Era para ele fácil perceber que teria uma vida perfeita daquele lado, ou uma vida miserável do outro lado. Ficava ali, no meio, onde tudo poderia acontecer dependendo do rumo que desse ao barco, à vida, como queiramos chamar-lhe. Estava entre dois mundos, muitos diriam que dividido, poucos compreenderiam que estava decidido e sabia o porquê de não querer sair dali. Ali, naquele sítio, era onde a magia acontecia, era de onde conseguia vislumbrar futuros que nunca seriam.. E dali vivia outra vida, a sua, a única possível, uma vida incompleta, talvez, uma vida inteira de certezas que nunca seriam. Dos ventos pouco se sabia, nem se sabia se existiam, sabia-se que volta e meia o barco se aproximava de uma ou outra margem, mas ele conseguia sempre voltar ao meio, a si, ao seu mundo... Quase se deixava ir uma ou a outra margem mostrava-lhe e provava-lhe que não pertencia ali, que pertencia a outro lado. Não se sabe para onde o vento o levou. O que se sabe agora é que ali nunca houve rio, nunca houve barco, nunca houve margens. Mas sabe-se que existiu, só se não sabe onde, nem como, nem quando. Existiu só... E no fim é o que acontece a todos que se perdem num mar de memórias, de recordações, de doces pedaços de vida eternos. Talvez tenha sido isso, talvez tenha chegado a esse mar, temido por uns, desejado por outros, vivido por tantos. Nem sempre os ventos são bons ventos, nem sempre as tempestades são grandes tragédias, tudo depende da forma como enfrentamos um ou outro... às vezes temos de nos deixar ir, outras vezes temos de aguentar e ficar... Dele dizia-se ter sabido sempre quando ir ou não ir e acredita-se também que muitas vezes foi quando devia ficar e muitas vezes ficou quando devia ir. Podiam apontar-lhe isso, mas não lhe podiam provar que estava enganado. Mesmo que quisessem, já ninguém sabia dele... Perdera-se do mundo, encontrava-se no seu mundo... Imaginava-se...

domingo, 9 de março de 2014

Cartas anónimas


"Amor, ao leres esta carta vai para o meio do jardim, dá um beijo numa flor julgando que dás em mim; Vai-te carta voando, cada uma diz o que quer, mas eu queria muito que fosses minha mulher..  Passei à tua porta estava dizendo teu pai "Tantas tantas têm caído, mas minha filha não cai!!"... Por teres sido enganada tens andado a cismar, andas toda aferrada, ninguém te pode aturar. Neste dia 1 de Abril, dia da brincadeira, só penso em ti e gostava de estar sempre à tua beira. Tristes dias eu senti, duro é o meu viver, ter-te junto a mim era o meu maior prazer. Queres saber quem eu sou mesmo, hoje podes saber e chorar por toda a vida sem nunca me chegares a ver. Se vires o mar vermelho não te assustes que é sagrado, são as lágrimas de sangue que por ti tenho chorado. 
Ai amor não tenhas pena de não saberes quem eu sou, pensa bem e imagina quem já tanto te amou.
Sou todo teu para sempre, muitas e muitas felicidades... (deste que sempre te ama) "

Isto, pelo que eles contam, porque em Abril se trocavam cartas de amor anónimas... Diz que o meu pai escrevia para a minha mãe! Diz que casaram no primeiro de Abril!

quarta-feira, 5 de março de 2014

Era uma vez...

Não foram poucas as vezes que me questionei acerca do que seria eterno, do que será ser para sempre... Há muito me indagava se havia algum significado em eternidade, se valeria a pena ser eterno... As dúvidas nunca se dissipavam completamente... Às vezes parecia absurdo pensar que sim, não fazia sentido a memória, a intensidade da vivência, da convivência, da entrega, tudo isto parecia não fazer sentido, tudo isto parecia vazio de conteúdo, tudo isto mais não era que um pensamento confortável para aligeirar a vida tantas vezes, aparentemente, vã, vazia, fugaz, efémera... Outras vezes, dias mais solarengos talvez, a eternidade fazia algum sentido, haveria sempre memórias que se prolongariam para sempre, haveria com toda a certeza alguém que, mesmo deixando de estar fisicamente presente, viveria para sempre dentro de nós, nos sussurraria ao ouvido com aquela palavra que nos recordava novamente do propósito da vida, do verdadeiro propósito da partilha, da entrega, da felicidade já dividida... Tudo isto foi, para mim, uma incógnita... Uma questão para a qual precisaria de muito tempo, precisaria de viver, de perceber, de cimentar... Até lá seria sempre dúvida... Até que um dia um homem fantástico, há muito entregue a um amor que não conhecia barreiras, há muito inteiro, um amor que o construiu e que o levou, talvez, ao homem fantástico que é... Para si a sua "princesa", como carinhosamente a trata, é maior que tudo, mais forte que todos, mais capaz que ele próprio e será sempre maior que o mundo!! Será para ele o mundo deles, para sempre... Vi-o carinhosamente dizer "até já meu amor", como nunca havia ouvido alguém dizer, com sinceridade, a entrega, o amor, o carinho que tanto os caracteriza... Foi nesse homem que entendi que a eternidade não é uma brincadeira, não é um refúgio dos sentidos quando nos perdemos nos dias mais escuros, não é uma palavra oca, não é uma promessa... É sim a conquista de quem soube sempre o que é, de quem sabe a quem pertence, de quem sabe sempre para onde voltar... De quem sabe que a presença de alguém será para sempre, de quem entende que viverão para sempre, mas agora só nele... Para sempre vão ficar os momentos, as recordações, o que construíram e que nunca poderá ser destruído, para sempre será o mundo deles... Vão viver sempre os dois naquele grande coração que se tornou maior por ela... Naquele coração que será pequeno para os dois... E será sempre um coração cheio... Porque foi sempre e assim será... Porque não há nada mais eterno que a entrega verdadeira de um amor... Um amor que será sempre olhado por todos como único, como maravilhoso... E agora continuam a viver juntos, talvez ainda mais juntos, vivem num só, por enquanto... Serão sempre brilhantes!! E tal como prometido por esse grande homem à sua princesa, viverão felizes para sempre...

Para um grande senhor!

sábado, 1 de março de 2014

Pedaço de vida

Tinha uma vontade incontrolável de fazer, pensando bem ainda não tinha construído nada e o que tentava construir mais tarde ou mais cedo caíria... Tinha também uma vontade enorme de que as coisas corressem bem, como sempre haviam corrido até então... Não era infeliz, pelo contrário, sentia bem o sabor da felicidade, não era tudo, mas caminhava para o todo que seria. Tinha uma vontade insaciável de viver!! Tinha uma vontade incontrolada, ainda, de conquistar o mundo... O seu mundo... Decidiu então escrever num papel em branco todos os objectivos, decidiu espelhar o seu futuro num papel branco, um simples papel que mais não seria que o sítio para calcular o futuro... Não conseguiu escrever nada, nada do que pensava lhe parecia fazer sentido, nada lhe parecia possível escrever, como que se escrever destruísse cada objectivo calculado... E tudo voltou a fazer sentido, o futuro não se adivinha... E a folha em branco serviu apenas para adivinhar o passado. 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Adeus

Despediram-se muitas vezes... Como que a treinar para um adeus que já há muito havia sido imaginado e que dificilmente seria outra coisa além disso... Sabiam que num qualquer dia a vida os levaria para longe um do outro... Cruzarem-se foi um feliz acaso e talvez tivesse sido sempre se ficassem... Mas, no fim de contas, quis o destino que se aproximassem já com a certeza de que não ficariam tanto tempo como talvez quisessem. De todas as vezes que se despediram com o leve tom de saberem que não iam doeu... Pensar destruía-os lentamente... Quando chegasse esse tal último adeus, aquele em que iam perceber que se voltariam eventualmente a cruzar, como quem volta a passar por aquele sítio que se transformou noutro, onde se passaram horas a rir de nada, onde se inventaram histórias encantadas para sempre, e que não iria nada ser igual, talvez tivessem vontade de ficar e voltar a ser o que já foram, mas sabiam que iriam seguir "viagem", porque já ali não pertenciam, ou julgavam não pertencer... Sempre que se deixavam invadir por esse pensamento os seus mundos tremiam... Afinal, ao fim de algum tempo, acabaram por suportarem o mundo um do outro... Às vezes ela não percebia que lhe segurava o mundo com um sorriso, um sorriso muito dela, um sorriso que tornava mundos frágeis em mundos intocáveis...

domingo, 23 de fevereiro de 2014

No fim foi igual aos outros todos

Perdido num mundo que não conhecia, tentava incessantemente encontrar alguma coisa... Sentia sempre que estava incompleto, sentia a cada passo que lhe faltava outro... Era uma busca constante de uma coisa que nem sabia o que era... Os dias iam passando e ele caminhando pelo tempo, como que se, a cada passo, vislumbrasse outro caminho, um caminho melhor, talvez. E enquanto caminhava de olhos postos no desconhecido, caminhava sem medo, com vontade, com convicção... Embora perdido, sabia que se iria encontrar em algum lado, que a qualquer momento daria o passo certo, o passo decisivo, o passo esperado. No fundo não procurava nada, procurava só o motivo pelo qual não queria parar de caminhar... Sentia-se perdido na multidão que já julgava ter encontrado tudo, ouvia as suas histórias, as suas conquistas, as suas vitórias e todas lhe pareciam iguais, vulgares contos... Muitas vezes pensou que, no fim de contas, a maioria das pessoas que ouvia é que estavam perdidas, perdidas nas suas vulgares conquistas, nas suas banais histórias... Enfim, todos tinham alcançado o mesmo sítio, de uma ou outra forma, uns mais depressa, outros nem tanto, outros parados... Era como que se só ele fizesse sentido num parado "mundo" preso às vitórias que nunca teriam sido, se o mundo de todos fosse o seu... Às vezes invejava-os, outras vezes lamentava que não ousassem caminhar mais... O tempo foi passando e a sua vontade de caminhar, inicialmente julgada inesgotável, foi-se perdendo... Sabia que se não tinha encontrado ainda, sabia que talvez nunca se conseguisse encontrar... Dele não se sabe mais nada... Sabe-se que no fim foi feliz, como outros tantos foram, no mundo deles... Neste mundo, no dele, a maioria teria ficado eternamente cega por uma venda que nunca arriscaram tirar, teriam sido eternamente tristes pelo medo de serem felizes... E no fim, bem no fim... Mais não foi que mais uma história, mais uma a acrescentar a tantas outras... Quem dele falava dizia que naquele vulgar mundo, onde ele próprio se julgou perdido, acabou por nunca ter sido encontrado... E agora ali jaz um homem sem identidade que se escondeu para nunca mais ser encontrado... Dele não se sabe mais que quase nada, sabe-se que se calhar foi diferente... E foi... Foi único no meio de tantos iguais a ele!

"No one can tell what goes on in between the person you were and the person you become (...) there are no maps of the change. You just come out the other side... Or you don't." 

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Cada um

Não foram poucas as vezes que fora atropelado!! Atropelado pelos outros, pelas ideias dos outros, pelas tendências dos outros, pela opinião dos outros, pela lógica dos outros, pela (in)capacidade dos outros, pela vontade dos outros... Calou e calou-se muitas vezes por causa dos outros... Calou-se com a dor dos outros, calou-se pela tragédia dos outros, calou-se pela (im)possibilidade dos outros, calou-se pela falta dos outros, na falta dos outros, calou-se sempre... Calou-se, foi atropelado, deixou-se sempre ficar para trás... Os outros, esses não se calavam, eles julgavam o mundo deles maior que o dos outros, julgavam os problemas deles maiores que os dos outros, cultivavam em si, esses outros, o espírito de de mártires, de infortunados... Nunca imaginou, porém, que calar-se tantas vezes o levasse um dia a ser atropelado por si próprio, pelas coisas que calou, pelas opiniões que calou, pelas vontades que atropelou, pelos medos que enfrentou (ou não), nunca pensou que os medos que escondeu para acolher o medo dos outros um dia o atropelassem com a vontade de quem vai conquistar o mundo com 1 folha de papel em branco. Sentia-se perdido num mundo que sempre fora seu e para o qual nunca olhara! Em vez de olhar para esse mundo que era o seu, ouvia a tempestade do mundo dos outros e enquanto não havia tempestades no mundo dele deixou-se ficar... Calado... Agora, agora trovejava no seu mundo, a chuva fazia-se sentir mesmo debaixo dos cobertos construídos com a certeza de nunca virem a ser precisos. Os mares varriam o seu mundo como ondas varrem areia das margens. Nunca tinha parado para construir barreiras às suas tempestades, preferiu aguentar sempre as tempestades dos outros, no fim de contas as tempestades parecem sempre magníficas quando vistas a uma distância segura. Agora, que as tempestades atingiram o seu mundo, sentia-se destruído... Dizem que aguentou porque encontrou alguém capaz de calar o vento e a tormenta do seu mundo, como quem embala uma criança ensonada. Se é verdade não se sabe, apenas se sabe que no mundo dele também chovia e não era tudo sol e finos em esplanada... Uns ficaram felizes, outros ficaram indiferentes, poucos entraram no mundo dele com vontade de o reconstruir, mas diz-se que os que entraram tinham a força de mil "homens"... Cada um!!

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Num sítio encantado

Já tinha sido há muitos anos... Num sítio encantado que ninguém conhecia, nem eles sabiam que existia, nem depois de o construírem. Viviam sem pensar e teriam sido felizes se se não tivessem lembrado de pensar. Nunca ninguém lhes havia dito que se não podia pensar em sítios encantados, ninguém lhes disse que o pensamento é que destruía sítios perfeitos. Perdidos uma vez em pensamentos, correram o risco de destruir o tal sítio, o sítio encantado deles. Tempestades surgiam a cada pensamento, o sol desaparecia a cada conclusão do que tudo significaria, a lua não surgia enquanto ponderavam o depois. Ninguém lhes tinha dito. Entre promessas perdidas numa vida que nunca chegou a ser dos dóis deixaram fugir aquele sítio construído à beira mar, exposto às ondas maiores, aos ventos mais fortes, exposto a tudo o que o podia destruir... Mas, enquanto não tinham pensado, eram intocáveis, nem a maior tempestade os conseguiria destruir, diziam os que de longe os conseguiam ver de quando em volta!! Um dia, um dia qualquer, de uma onda maior que o mar surgiu uma parede que os derrubou e os tentou fazer perder de vista. Julgados separados até ao fim dos dias lutaram contra todas as tempestades, contra todos os monstros que haviam criado, contra todas os muros que se lhes impuseram, ultrapassaram todas as  histórias que se haviam inventado que nunca mais se encontrariam... Lutaram, como quem luta com o anjo do destino e acredita que o consegue vencer, lutaram até não lhes restar mais nada, nem sítio, nem tempo, talvez restasse um sopro de vida, de vida dos dois que se perderam! E, depois de nunca desistirem, lá se encontraram noutro sítio qualquer, longe daquele encantado que criaram. E de lá construíram outro, porque as ondas até podem destruir um sítio encantado, mas nunca os destruiria, no fim todos perceberam que encantados já eles eram e onde quer que estivessem seria um sítio encantado, porque o anjo do destino já há muito percebera que lhes não podia impor outro fado que não aquele que eles quisessem... Eram livres porque sonhavam e porque acreditavam, não se deixaram perder nas tempestades inventadas pelos que os queriam destruir, não se deixaram levar pelos pensamentos tempestuosos que de quando em volta os caracterizavam! Eram livres e encantados por uma estranha capacidade de resistir a tudo, resistiram ao destino, resistiram à morte enquanto viveram. Não se sabe se foram sempre assim, se ficaram juntos, o que se sabe era que o sentimento que os unia nunca os deixaria ficar muito longe, puxavam-se um para o outro mesmo que não quisessem... Dizem os que acreditam, que mesmo que não tivessem lutado, todas as tempestades os voltariam a juntar, como que de um feliz acaso se tratasse!! Podem não ter ficado juntos, mas estiveram sempre lado a lado, apoiaram-se incondicionalmente, até onde se ainda não julgava possível!! Não se sabe se foram felizes, o que se sabe é que o que quer que tenham sido, foram juntos!! Não se sabe se o sítio que voltaram a construir era encantado, não se sabe se mais tempestades viriam, ou vieram... O que se sabe é que mais que sítios, mais que tempestades, mais que ventos e tormentas e monstros... Foram sempre os dois... Numa dança infinita até acabar... Ao fim de muitos anos sabe-se que foram esquecidos, mas nunca se esqueceram!!

De: Helena Coutinho

"Aqui jaz um corpo que esculpiu palavras.
Aqui jaz o sorriso de quem ousou querer o mundo dos imortais;
os cabelos onde borboletas passeavam liberdade
e as mãos de jardim, onde beija-flores bebiam fantasia…
Aqui jaz a que não temeu sonhar todas as vontades do coração.
Aqui repousa a alma da que jamais descansou de sentir tudo,
de todas as maneiras.
Aqui ecoará, para sempre, um querer, infinito, de poeta.
Aqui perdurará o tempo que a vida não me deixou escrever."

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Boa noite

Mais uma noite havia passado... Mais uma noite perdida... Talvez... Afinal, quantas noites já perdera ao longo destes anos... Já há muito havia percebido que a maioria das noites não dormidas pouco mais eram que nada. Pouco mais que uma dor de cabeça no dia seguinte... Deitou-se embriagado pelas conversas da treta, drogado pelos cenários de embriaguez que perseguiu a noite inteira. Antes tomou um café, como que para despertar para dormir. Ou para se envolver com as pessoas que perderam a noite a dormir e acabavam de acordar para mais um dia, enquanto ele se preparava para dormir. Chegado a casa caiu redondo, como que se o café o tivesse deixado cheio de energia para dormir. Quando acordou tinha a ideia de que a noite não fora nada, foi uma noite igual às outras todas. O tempo passou e outra noite se aproximou. Aos poucos foi percebendo que não foi só mais uma noite, foi uma noite diferente das outras todas, voltou a ver o sol nascer. Voltou a perceber que nem tudo se perde na tempestade, percebeu que nem tudo o que é dado como perdido é encontrado. Percebeu que muitas vezes o que está perdido não deveria ser mesmo encontrado. Aos poucos foi percebendo que se tem de aceitar o que fica para trás para conseguir compreender o que vem pela frente. "Foi uma boa noite", pensou!! E por aí vem outra, outra nova noite. Será sempre só mais uma, enquanto houver outra a seguir. E é assim que tem de ser, foi assim que percebeu que o passado nunca terá o peso do futuro e a leveza do presente. "Sim, foi mesmo uma boa  noite"!!

Boa noite...

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

No meio do caminho tinha um poeta

"No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra."

Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Uma cerca, uma pequena cerca

Era feliz, até ali, até onde conhecia. No fundo nunca pensara muito no que teria feito para ser feliz. A vida corria-lhe como o sangue, que sabia correr-lhe nas veias desde aquela vez que se cortara a avançar aquela cerca. Não ligou muito, a felicidade estava do outro lado, o golpe, esse, mal o sentiu. Atingido o outro lado, a felicidade corria-lhe mais depressa que a dor lhe percorria o corpo. Muitos anos lhe haviam atravessado desde esse pequeno golpe de felicidade. Agora, da janela, olhava para a cerca e perguntava-se como a teria algum dia avançado, era alta, pensava. Naquela altura não pensou, avançou sem medo, sem pensar, avançou sem calcular. Hoje, da tal janela diferente das outras todas, observa a felicidade do outro lado, com a certeza óbvia de que desta vez nunca a conseguirá alcançar. A felicidade ainda lhe grita, lá, do outro lado "Anda, tu és capaz, já o fizeste antes!! Não penses, não tenhas medo, afinal o que tens a perder? Nunca pagarás mais que um golpe!! E se não valer a pena será só um golpe, um golpe que te fará lembrar que pelo menos tentaste". Do lado de cá respondia-lhe envergonhado que tinha medo, agora tinha a capacidade de calcular os riscos e era demasiado arriscado tentar um salto que sabia impossível para as suas pernas, tivesse, ao menos, uma escada para lhe facilitar a subida e um colchão para lhe amparar a queda do outro lado. Não tinha nada além de um colchão do lado de cá e uma escada do lado de lá. Vistas assim as coisas, fazia mais sentido a felicidade vir até ele. Só não viria se não quisesse, tinha tudo a seu favor. Todos os dias espreitava à janela , sempre a mesma escada, sempre a mesma felicidade, sempre tudo ao contrário. Longos anos se devem ter passado, agora imaginava que nem conseguiria subir a escada se o mundo se virasse e ao cair ao outro lado pouco mais lhe restava que uma perna partida. A felicidade, essa, já lhe havia deixado de acenar há muito. Pelo que parece não espera pela coragem, já há muito deveria ter tentado a medo. Agora, agora até teria coragem, mas seria um salto em vão, talvez caísse, talvez já tivesse caído há muito no esquecimento. Talvez fosse apenas uma breve memória do que nunca foi para a felicidade. É tarde, é sempre tarde. Talvez o colchão fosse um trampolim, quem sabe. Um dia foi até perto da grade... Já tarde, já sem nada do outro lado. Era uma grade caída, quem diria. Lá, de longe, da janela, pareceu-lhe sempre intransponível e afinal, dali, era só serpentear por entre os ferros e estaria do outro lado. Não se atreveu a ir ao outro lado e descobrir que não havia nada... Preferiu voltar para a janela e continuar a imaginar que a grade foi sempre assim, intransponível, porque no fundo foi... Foi uma barreira, talvez psicológica, para aquilo que nunca chegaria a ser. E sabe-se que nunca foi, porque já não havia nada para ser. Não se sabe bem quanto tempo passou, o que realmente aconteceu não se sabe, só se sabe que não foi tempo. sabe-se que o tempo passou, não se sabe para onde. Mas agora, que também há-de ser tempo, não há nada a não ser mais tempo para mais nada. E diz-se que a sua vida foi cheia de nada. Diz-se que poderia ter sido tudo. É tarde para ele, para a felicidade e para a grade que se diz ir ser removida para construir um muro. Dali, da janela, lamenta apenas que o muro o impeça de ver a felicidade. E acaba por se nem lembrar que poderia correr para o outro lado antes que levantem o muro. Afinal, ali poderá ser sempre feliz com o que não há do outro lado. Porque enquanto estiver do lado de cá, haverá sempre felicidade do lado de lá. E há-de ser esta esperança que o faz acordar todos os dias e percorrer o mesmo caminho de sempre para lado nenhum.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Nada

A vida vem com morte marcada... Às vezes vem mais tarde, às vezes vem mais cedo... Há a sorte de não termos de esperar no mesmo sítio e há a sorte de se poder tentar viver enquanto se espera. Uns perdem o tempo com a vida dos outros e assim perdem o tempo da vida delas. E a cada instante que passa é mais um instante que se perde ou se ganha. Não se pode ganhar à morte, pelo que se crê, mas pode-se vencer batalhas de instantes. E a todos os que se perdem na vida dos outros e perdem mais um bocadinho para a morte, enquanto julgam ganhar um bocadinho da vida dos outros costuma dizer-se: nada...

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Saudade

Estava por ali perdido em pensamentos. De repente um sentimento invade-o abruptamente. Era um sentimento todo ele novo, cheio de emoção, cheio de vida e no entanto vazio... Era saudade, mas era um novo tipo de saudade que nunca experimentara... No entanto não se assusta, apesar de ser um sentimento que nunca conhecera, não o fez pular do seu confortável sofá. Por ali andava a saudade do seu cão, aquele que sempre desejara ter e nunca acabara por "conquistar" (sim, porque um cão tem de se conquistar, não é só ter lá em casa), tinha saudade daquelas férias com os amigos que nunca chegaram a ser, tinha saudades daquele amor que nunca chegou a viver, saudades daquela viagem para não mais voltar que nunca tivera coragem de concretizar, sentia saudade daquele casaco que viu uma vez numa qualquer rua que acabou por não comprar. Tinha saudade até daquele momento em que não foi, mas acabou por ir e não devia. Tinha saudade daqueles breves momentos em que pediu que não fossem, tinha saudade da tristeza daquele amor, daquele que também não deve ter sido. Tinha saudade de tudo o que quase foi. Tinha saudade de ter arriscado!! Tinha saudade. Onde outro qualquer teria encontrado arrependimento ele encontrou saudade. Talvez porque tenha sempre compreendido porque ficava, porque não ia, porque seria, porque não poderia ser, porque deveria não comprar um casaco que combinava mal com as meias, porque sabia... E o saber deixava-o ter saudade... Deixava-o sorrir para o passado com orgulho... Deixava-o sonhar com o que não foi! Era um sonhar com o que seria, era no fundo, como alguém lhe havia dito um dia, "ter saudade do futuro"... Porque se nunca chegou a ser ainda não é passado, ainda é uma porta aberta para o futuro. Foi por ali, por aqueles instantes que percebeu que não era, afinal, uma pessoa sem sonhos. Percebeu ali que os seus sonhos são os mesmos de sempre, são já saudade, são já como se tivessem acontecido sem nunca o terem de ser. Percebeu, por fim, que sonhava mais que todos os que lhe apontavam o dedo por sonhar de menos e se diziam sonhar alto. Sonhavam baixo, afinal... Sonhava mais alto ele porque esteve sempre a um pequeno passo do sonho da saudade. Ao contrário dos outros, que sabem onde estão os sonhos, mas não sabem como lá chegar, ele sabe porque não chegou à saudade e agora é só sonhar. Agora é só continuar a sorrir para tudo o que tem e ter saudade de tudo o que poderia ter. É olhar, sorrir e sonhar com a saudade que terá um dia pelo que nunca foi hoje. Ah, saudade!! Saudade do futuro preso por bocadinho de sonho perdido num passado que ainda pode não o ter sido. 

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Heróis

Os heróis de antigamente faziam frente aos mais poderosos, os heróis de agora batem nos miúdos pequenos. Os heróis de antigamente construíam tudo com um quase nada que se não sabia de onde vir, os heróis de agora destroem tudo sem se perceber como será possível destruir tanto em tão pouco tempo. Os heróis de antigamente opunham-se, sem medo, às opiniões pequenas... Morriam, mas com eles morria a convicção de que sempre foram o que quiseram. Os heróis de agora adaptam-se às opiniões e morrem invictos, sem verdade, sem razão... Vazios... Os únicos heróis, agora, são os que amam sem querer destruir o que os que amam possam amar mais. Os únicos heróis, os que ainda se podem chamar, são os que constroem à sua passagem, são os que deixam ficar a medo, são os que olham e vêem para lá de si. Os verdadeiros heróis sãos os que abandonam o conforto dos seus lares, para partilharem o lar atormentado de outros "quaisqueres", são aqueles que abraçam um moribundo, são aqueles que respiram ao lado de alguém que dá, por fim, o seu último suspiro. são aqueles que sofrem com os que se não salvam, são aqueles que que descem ao mundo, sem medo de não voltar e abraçam os que são aceites como ninguém. São os que sabem tanto quem ser que, sem medo algum de se perderem de quem são, se confundem com a multidão de "ninguéns" e com eles caminham para o fim, que esperam não ser também o deles. São esses os heróis, é por esses que o mundo ainda faz sentido... É por eles que ainda existe a palavra "herói", é por eles que esta palavra mais não é que mais uma terra do nunca. Por eles.

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Amanhã

Sentia-se cansado e mesmo assim, embalado pela chuva lá fora, não conseguia adormecer. Viajara pelo mundo inteiro já... Os dias revelavam-se uma loucura, caminhos cruzados, caminhos perdidos, direcções opostas, caminhos sem saída!! Tantos caminhos percorrera, perdera-se tantas vezes que agora, às voltas com o sono que lhe não dá a volta, não sabe bem onde está. No entanto, mesmo não sabendo onde pertence, sabe de todos os sítios onde já pertenceu... Sabe que um dia talvez possa voltar e se não voltar a encontrar, nunca mais... Talvez tenha nascido para se nunca encontrar, para nunca ser encontrado. Julga nunca ter percorrido o mesmo caminho e no entanto sente que já ali passou várias vezes. Talvez num sentido oposto, talvez perdido do caminho que queria que fosse de sempre... Não se encontra, mas também não se perde. Quem se não encontra nunca correrá o risco de se perder. E a noite, como que a pedir desculpa, deixa-o dormir embalado pelo seu silêncio... O silêncio dela para quem julga nunca se ter perdido de si. Os caminhos perdidos não lhe gritam por não ter voltado, sente apenas um leve sussurro, talvez de um caminho que nunca havia percorrido. Adormece... Talvez amanhã se encontre, talvez depois se volte a perder... Hoje está ali, onde não se julga encontrar, onde se não julgar perder. Amanhã, amanhã é só mais um caminho perdido até à noite... Talvez um dia encontrado até outro dia perdido...Mas só amanhã, hoje olha para trás e recorda-se de todos os sítios por onde já passou... E acaba por descobrir que esteve sempre no mesmo por ali pelo mesmo sítio de sempre, umas vezes perdido, outras nem tanto... Talvez amanhã consiga compreender, talvez...

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

O tempo dos outros, de todos...

Às vezes o simples entender do andar do tempo e do desenrolar do seu processo fazia-lhe impressão ao olhar para os que lhe eram de perto... Era como que se a cada momento que passava perdesse mais um bocadinho deles, para outros. Era perder bocadinhos seus a cada instante para quem se não sabe... Era um ser destruído constantemente sem perceber. E depois, quando se percebe para onde se caminha, para onde os outros caminham, quando se percebe que todos acabamos por caminhar para longe de nós, ou pelo menos quase todos, percebemos que somos pouco e mais tarde ou mais cedo seremos nada. E os outros serão tudo um dia. E nós teremos de ser tudo noutro sítio. E temos a certeza que nunca seremos. E acabamos por duvidar de que todos os outros sejam tudo, pelo menos durante muito tempo. Acabamos por acreditar que somos nada. E nada faz sentido em tudo! E no fim, quando tudo se acaba, levamos tudo... Tudo o que teria sido e o nada em que se tornou. E vamos cheios de tudo o que não foi e foi noutro sítio qualquer. E devemos ir assim.. Sem sentido, perdidos no tempo, perdidos de nós, perdidos do mundo...

domingo, 19 de janeiro de 2014

Foram

Fez do seu mundo deles... Fez do seu sonho, um sonho deles e para os dois... Fez do seu futuro o futuro deles!! Fez de si eles, perdeu-se dos seus defeitos mais evidentes e afastou os dela como que numa troca onde ficaram os dois sem nada do que não importava... Viu-a no seu futuro, já era o futuro deles... Tinha conseguido criar todo um novo mundo... Um mundo que seria deles e para eles e nunca seria só seu!! Depois acordou e nada fazia sentido, esse futuro nunca existiria!! Voltou a adormecer para poder continuar a acreditar. Às vezes acreditar no que nunca será é melhor que não acreditar em nada... Não viveu... Sonhou... E dizem os poucos que sabem que foi feliz com o que nunca foi e triste com o que era... Nunca foi cheio, nunca foi vazio... Foi sempre assim assim... Mas pelo menos nunca foi o que não quis... Também nunca foi o que sonhou perguntavam-se todos muitas vezes... Eles nunca lhes respondeu, sorriu sempre apenas, com a resposta presa ao coração... "O sonho nunca poderia ser mais que isso, de um ter sido em sonho, de um não poder ser real, de um ser perfeito ali, no sonho... Nunca teria sido outra coisa, só poderia ter sido aquilo!! Foi sempre seu, foi sempre perfeito." Dela nunca se soube grande coisa, dele também não... Só se sabe que nunca foram... Foram uma vida inteira sem saberem, ou pelo menos ela... E serão-no sempre enquanto ele se lembrar e continuar a sonhar... Foram eternos, até onde a memória se lembra!! 

domingo, 12 de janeiro de 2014

Listener - There Are Wrecking Balls Inside Us - Audiotree Live


Aconselha-se!! De tal forma que arte há-de ser isto... É como que deitar fora a
alma ao microfone!! É como escrever em pedra com duas penas!!

Saudade

Sentado à lareira de sempre sentia-se invadido por uma nova saudade... Desorientado no desconhecido de uma saudade que nunca fora tão sua por ali ficou a pensar no que poderia fazer... Não poderia fazer nada... Ali se deixou continuar até sentir a saudade tão sua... Abraçou-a e deixou-se embalar por um sono deles... Fez o melhor partilhou com ela os seus sonhos e pelo menos enquanto dormia sabe-se ter sido feliz!!

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

O vento há-de ajudar

A vida dava-lhe tantas voltas que a dada altura deixou de perceber como poderia dar a volta à vida. E todas as noites encontrava uma solução e ao acordar a solução perdia-se, talvez no sono e consequente sonho absurdo tantas vezes, que parecia fazer ainda mais sentido que uma solução que nunca o seria. Perdido no caminho de sempre tentava dar a volta. Uma volta que nunca conseguiria dar depois de tantas voltas dadas. Queria voltar ao princípio e de repente percebia que depois de crescer se não pode voltar à caixinha pequena de sempre. Depois de crescer a vida ganhou um tamanho que temia não suportar sozino. Dali nem conseguia ver quem fora. Parece que foi sempre assim, não se apercebeu que a vida o mudara e o moldara ao que é hoje. Entre um e outro traço de sempre nao conseguia encontrar-se. Mais que perdido, não tinha para onde ir. Caminhava sem sentido e sem retorno. Só podia ir para a frente e para a frente assusta. Sentia-se como uma daquelas folha que cai, seca de uma qualquer árvore em Outono, ao sabor do vento que a guiava. Sentia que não poderia voltar à árvore, só lhe restava chegar ali, ao chão, ao seu inevitável destino. Sentia que o vento o poderia levar para qualquer lado, mas do chão nunca fugiria, a menos que uma daquelas pessoas que se apaixonam por coisas que passam invisíveis aos olhos de toda a gente o tentasse apanhar, mesmo que já tivesse caído ao chão. O chão não teria de ser o fim, bastava que alguém o visse, ali, caído, quieto, parado, ao sabor do que o leva. Folha sem esperança, ao sabor do vento, perdido da árvore que o viu crescer e lhe podia lembrar como foi, como foi sempre e como se tornou assim. Não podia voltar. Nunca mais. Deixou-se ficar ali mais do que o tempo julgava ser possível. Dizem que ficou ali até morrer e permaneceu. A ver as folhas caírem sem esperança numa dança descoordenada e sem sentido. E nunca nenhuma folha caía da mesma forma, em mil anos que se diz ter ali ficado, todas elas se deixavam ir à sua maneira para onde nunca saberiam. Eram só folhas. Era só uma estátua. E o vento fazia-se sentir, talvez fosse vento de mudança. Talvez fosse só inquietação. 

sábado, 4 de janeiro de 2014

chuva

Mais uma manhã de chuva, daquelas manhãs que dá vontade de não deixar ir embora porque nos embala num sono em que se fica acordado e se parece sonhar, quando, no fundo, o que acontece é pensar com o coração... Por ali se deixou ficar, a imaginar, a deixar-se levar pelo que o faria feliz, por entre a chuva que se atirava à janela com vontade de lhe calar a vontade... Durante esta tempestade pequena pensava como seria se simplesmente não pensasse do outro lado, se por momentos pensasse em si, se por um instante conseguisse dizer o que sentia sem pensar nas repercussões do que seria dito... Seria feliz com toda a certeza, mesmo que o que dissesse não surtisse qualquer efeito!! Poderia dizer para não ir, podia dizer o que ir significaria para ele, poderia explicar como seria o mundo se... Poderia tentar pelo menos... Por entre a chuva caiu um trovão, todos estes pensamentos idiotas de quem gosta e não pensa se foram embora e saiu daquele transe!! Continuou a gostar calado pela tempestade, ficou ali, a olhar apaixonado, a pedir baixinho que tudo corresse bem, pelo menos àquele lado, ficou a ouvir a chuva que se não calava, mesmo com os gritos dos trovões... E ele, calado com o medo à felicidade que poderia nunca ser, ficou ali deitado até adormecer... Com medo de não a fazer tão feliz como ela merecia, deixou-a ser feliz como já era antes dele. E por entre os trovões que lhe gritavam ao ouvido percebeu que era o que deveria fazer, porque acima dele estava a felicidade de outra pessoa, que poderia ser uma pessoa qualquer, mas não, era a felicidade de quem queria mesmo ver feliz, ver brilhar pelo mundo como só ela poderia. E isso, isso também o faria ser feliz com toda a certeza. Assim adormeceu, embalado pela ideia de que pelo menos lhe se lhe não atravessou à frente e nunca foi um entrave ao seu brilho que o cativava ainda mais de cada vez que sorria. Era como que se o seu sorriso para ele fosse como a sua felicidade, e sentia que a cada sorriso gostava ainda mais. E sabia que pelo menos nunca silenciara aquele sorriso, nunca calara aquela alegria. Podia dormir, por fim, descansado. Ela seria feliz e ele, se tivesse sorte, poderia continuar a vê-la ser todos os dias.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Bom Ano

"Recomeça…Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo
Ilusões sucessivas no pomar
E vendo
Acordado,
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças."

Miguel Torga, Diário XIII

Era uma vez... Um menino muito pequenino, sentado à janela do seu quarto. Dali via um pequeno riacho, umas escadas, daquelas que já não há, ...