sábado, 9 de janeiro de 2016

Lembramo-nos de que mentem todos aqueles que dizem deixar de amar... Ou aqueles que dizem que conseguem, se forem magoados, transformar o amor em ódio... Mentem aqueles que dizem que o amor é sempre maior que tudo... Mentem também os que dizem que se não sente, no toque dos lábios, o amor de uma vida... Que se não sente num abraço o calor de uma vida... E mentem os que dizem que não há apenas uma pessoa capaz de nos fazer tirar os pés do chão e voar... E mentem os que dizem que não há ninguém no mundo capaz de nos fazer rastejar pelos becos do sofrimento...
Há, talvez, amores assim, que possam deixar de ser... Há amores que possam não ser tão grandes... Há-de haver amor que não nos transcenda... Há-de haver menos amor.. Um amor mais pequenino... Daqueles amores a meio, que nem aquecem muito e que acabam por nem ser muito frios... Amores onde há um acomodar, um aceitar não ser mais... Onde se acaba por ser cúmplice de um viver à margem de um amor maior, em troca do conforto e do sossego de não ter de se dar tudo... Onde se pode perder... Onde não temos de ser inteiros... Onde não temos de ir sempre, porque há-de estar sempre ali e se não estiver, há-de estar outro...
Mas quando é amor, sente-se... Sente-se tudo... Sente-se a ausência, sente-se a falta e sente-se necessidade para lá da vontade... Somos dominados por um sentimento que nos faz perder a razão, que nos faz querer ser só ali, naquele sítio...É um querer estar sempre, querer partilhar tudo, querer fazer parte de tudo... 
E quando o amor não chega... E quando esse amor vai sem direcção... Quando o amor perde o sentido e quando já não passa de algo em que já se não pode acreditar, sente-se dor, sente-se raiva, sente-se revolta e sente-se o frio do mundo debaixo dos pés... Quando tudo se perde e a realidade vai contra o sentimento que nos rasga de dentro para fora, quando a impossibilidade nos rasga o peito de fora para dentro... Dói... Morde-nos o corpo e deturpa-nos a vontade... Faz-nos querer desaparecer de um mundo que já só parece meio... E que nunca voltará a ser inteiro...
E a vida, a vida passa a saber a pouco... O que se constrúia para lá do que se via deixa de ser sustentado e cai... Esmaga-nos... Fica só um vazio sem espaço... Não cabe nada para lá de vazio... Somos ocos... Somos menos... Deixamos de ser aos bocadinhos... E depois percebemos que mentem também os que dizem que o tempo leva tudo... Não leva, o tempo não leva este vazio... O que o tempo faz é tornar oco o vazio... O que o tempo faz é ensinar-nos a viver com metade da vida... Como quem vive com meio coração... Aos poucos vamos sendo metade daquilo que seríamos... O tempo faz com que recalquemos um sentimento que foi maior que nós e faz com que queiramos ser só mais um no mundo... A viver pela metade... Ao lado de uma pessoa que até poderia ser tudo, mas nunca vai ser nada... E vamos viver assim... Em lume brando... Com meio brilho... E vazios... Vazios de tudo... Vazios de amor...
E aquele amor que foi... Fica ali... Parado... À espera de outra vida... De outra vida que nunca virá... E no fim, bem lá para o fim... Pode ser que tenhamos a sorte de nos conseguirmos enganar e confundir o vazio com felicidade... E pode ser que com sorte a memória nos falhe e nos apague o vazio que nunca será cheio... 

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