sexta-feira, 5 de agosto de 2011

O amor nao espera.

Josefino, um miúdo nascido e criado numa pequena aldeia, que nunca dali tinha saído, exceptuando uma ou outra vez que o levaram a uma cidade. Josefino cresceu a ouvir boa musica, a ler bons livros, conviveu com pessoas cultas, algumas das quais das grandes cidades. Quando atingiu os 18 anos, resolveu partir para uma aventura. Atrás de conhecimento, de vivencias que jamais a sua pequena aldeia lhe poderia proporcionar. Despediu-se então de todos os seus amigos com especial carinho da sua “confidente” Maria Lúcia.
(Todos julgavam que aqueles dois estariam predestinados a ficar juntos, não fossem eles inseparáveis desde tenra idade.) Maria Lúcia já se tinha apercebido que sentia algo mais especial por Josefino, mas como as suas conversas se mostravam sempre um bocadinho mais profundas e interessantes, não se julgou à altura de uma tal relaçao, até porque não convivia com as pessoas intelectuais que acabavam por rodear Josefino.
Este por sua vez tinha a plena noção de que Maria Lúcia jamais seria capaz de atingir o seu estereótipo de mulher.
Josefino parte atrás do seu sonho. Maria Lúcia, ainda meio atordoada com a perda, fica recolhida em sua casa dias a fio, sem saber o que fazer, é então que lê o primeiro livro e se começa a interessar pela leitura, (Josefino esquecera-se do livro que levava para a viagem quando se fora despedir de Maria Lúcia.) até então Maria Lúcia dava muito mais valor às brincadeiras lá fora, às sensações quotidianas, às aventuras pelos campos, nunca se importara até então com o futuro, com a perda, sempre viveu, simplesmente.
Josefino acaba de partir, entra no comboio e lembra-se que deixou o livro para a viagem em casa de Maria Lúcia.
“Como é que me fui esquecer da porcaria do livro, logo em casa da Lúcia que nem sequer o abrirá, bem o sei, básica e desinteressada como é. Dá demasiado valor à simplicidade para perder tempo com um livro, que a poderá até levar a questionar todo o seu passado.” Pensou Josefino, convicto de que a distancia intelectual que os separava não tinha fim.
Após 3 horas de viagem Josefino chega à próxima paragem, é uma aldeia maior. Pega então no telefone (ainda não havia aquela peste chamada telemóvel, caso contrario Josefino nem sentiria tanto a falta do livro, bom companheiro de viagem) e liga a Maria Lúcia.
Mãe de Lúcia: Estou?
Josefino: Olá boa tarde, fala o Josefino, podia chamar a Maria por favor?
Mãe de Lúcia: Só um bocadinho que ela está no quarto…
(“Estranho, a Maria nunca está fechada em casa a esta hora, anda sempre lá fora a correr pelos campos e a pregar partidas a toda a gente” pensou Josefino esquecendo rapidamente o pormenor e não lhe dando a devida importância.)
Maria: Josefino, então como está a correr a viagem?
Josefino: Está a ser fantástica por enquanto, a paisagem é extraordinária mesmo. Irias adorar ter vindo comigo. (Por se ter esquecido do livro foi-se distraindo com a paisagem. Não e a primeira vez que faz esta viagem, mas nunca se tinha dado ao trabalho de contemplar a paisagem)
Maria: Oh, partiste assim de repente, nem me perguntaste se gostaria de ir também. Assumiste desde logo que eu nao ia. (Maria sabia que Josefino partira atrás de um sonho, já mais que uma vez lhe tinha dito que na aldeia nunca iria encontrar uma mulher à sua altura)
Josefino: Mas tu com toda a certeza não irias gostar da viagem, vou para a cidade grande, não te ias adaptar. Só irias gostar deste pequeno bocadinho que em nada se compara ao tipo de viagem que programei.
Maria: Por vezes não é a viagem que conta, é o percurso que fazemos, são os pequenos pormenores que fazem com que uma viagem inteira valha a pena.
Josefino: Sim, em parte tens razão. (Josefino, que falara tantas vezes com pessoas intelectuais, ligadas à ciência, à educação e a outras áreas eruditas nunca ouvira uma afirmação do género)
Maria: Deixaste cá um livro, acabei por começar a lê-lo, a tua recente falta quebrou-me a rotina.
Josefino: Em pouco tempo volto, vais voltar à tua vida normal.
Maria: Não sabes, essa tua viagem pode mudar a tua vida e por consequência a minha.
Josefino: Pois, de facto, mas não creio que em tão pouco tempo tanta coisa possa mudar. (Josefino deixava de ter argumentos válidos para as afirmações de Maria.)
Maria: Pronto Josefino, espero que a viagem corresponda a todas as tuas expectativas, bem sei o quanto desejavas esta viagem.
Josefino: Até breve Maria.
Josefino não ligou a mais ninguém, apesar do pequeno diálogo, houve vários momentos de silêncio, momentos esses que se assemelham áqueles em que 2 pessoas que têm imensa saudade uma da outra e acabam por nao dizer muita coisa.
Josefino volta a entrar no comboio em direcção à grande cidade. As paisagens vão-se-lhe aproximando e fugindo sem lhe dar o tempo que ele gostaria para reparar nos pormenores. Tinham-lhe dito que os pormenores eram muito importantes e ele não tinha tempo.
Três dias teriam passado, eis então que chega à cidade grande. Olha à sua volta e sente-se completamente perdido, vê pessoas “estranhas”, pessoas que caminham apressadamente atrás do que lhes não foge. Tenta meter conversa com um senhor que apressadamente desce a rua, tinha boa aparencia, diria que pertencia ao tribunal, ou a uma agencia de advogados, acartava consigo um livro da constituição da republica portuguesa.
Josefino: Boa tarde, poderia por favor dizer-me onde poderei almoçar?
Senhor: Jovem, não me parece que consigas frequentar os sítios que costumo frequentar. (Escusado seria dizer que Josefino aparentava precisamente aquilo que era, um miúdo da aldeia perdido numa grande cidade).
Josefino sentou-se num restaurante, não se importava nada com o dinheiro que poderia vir a gastar, afinal, a sua viagem poderia terminar assim que ele quisesse.
Não acostumado a cardápios como lá lhe chamavam, perguntou ao senhor da mesa, que por sinal seria garçon, quais os pratos que aquele estabelecimento dispunha.
- Não se importaria, por favor, de consultar o cardápio? responde-lhe.
- O quê? Retorquiu Josefino.
- O cardápio, a carta, a ementa, como lhe deseje chamar.
- Ah sim, peço imensa desculpa.
Josefino não percebia quase nada do que se lhe era oferecido na carta. Acabou por pedir um “bife a cavalo”, o qual teve de descrever ao garçon, que desconhecia por completo a expressão. Afinal Josefino, que se julgava bem superior à sociedade da sua pequena aldeia, no meio da cidade era um completo ignorante.
Passadas duas semanas de ter chegado, já se tinha ambientado à cidade e à sua funcionalidade, já saía à noite, já começara a falar com mulheres aparentemente inteligentes, que bebiam, sorriam e tinham um comportamento social muito requintado.
Ao que parece parte do seu objectivo começava a ser atingido. Na manhã seguinte decide ligar a Maria. Já tinha ligado à família a dizer que ninguém conhecia o "típico" ovo a cavalo, “cambada de estúpidos” chamou-lhes na conversa com o pai. Liga entao a Maria.
Atende a mãe de Maria que lhe explica que a sua amiga de sempre tinha saído para ir ao teatro com um tal de Manuel, que estudou fora e voltara há poucos dias. A mãe fez logo questão de explicar a Josefino que Manuel era um rapaz extremamente inteligente, filho de boa gente e tirara Direito. Tencionava abrir um escritório mesmo ali na aldeia.
Josefino ficou intrigado. “Como é que será que alguém que esteve fora durante tanto tempo, conheceu a fundo pessoas extremamente inteligentes, alargou os seus horizontes, conviveu de perto com arte, literatura e teatro, que enfim, fez tudo aquilo que eu sonhei volta para a aldeia com o objectivo de ali fazer a sua vida? E ainda sai com a Maria, que nada deve ter a ver com ele” Pensou de si para si, afinal ainda não tinha feito um único amigo desde que chegara. A falta que Maria lhe fazia nesta altura “Nem que fosse para dizer um simples: É maluco, só pode”.
Já se encontrava na cidade há vários meses, já saíra com algumas mulheres, daquelas que ostentam alguém que não são e deu conta de que Maria seria uma companhia bem melhor, “agora até vai ao teatro” pensou.
Muitos dias não passaram até que Josefino decidiu voltar para casa. Afinal todas as histórias que ouvira acerca da grande cidade não passam disso mesmo. Histórias.
A vida na cidade ainda consegue ser mais rotineira que no campo pensou de si para si, reparara que ao fim de quase oito meses continuava sem amigos.

Entra no comboio de volta à sua pequena aldeia, passados 3 dias está em casa. Qual o seu espanto ao descobrir, à chegada, que Maria tinha mudado imenso desde que tinha partido nesta sua viagem. Dirige-se ao seu café de sempre para encontrar os amigos de sempre, finalmente poderia contar as suas peripécias e aventuras, que devido às suas limitações (Limitações culturais) iriam achar as suas histórias fascinantes.
Após alguns dias reencontra-se com Maria, “finalmente” pensou. Maria já não se vestia como antigamente, também se não vestia como as mulheres fúteis que encontrou na cidade. Parecia uma mulher, não parecia a menina de 18 anos que tinha visto crescer e que nunca se tinha preocupado com a sua aparência.
- Maria, tinha tantas saudades tuas, como eu te queria contar como estavam a correr as coisas na cidade. Cheguei a ligar-te, mas recordo-me que tinhas saído, devias andar a correr pelos campos como é teu costume.
- Não, ligaste-me um dia em que tinha ido com o Manuel ao teatro, gostaria de ter retornado a chamada, mas nunca tive um contacto teu, queria muito que soubesses que finalmente me começara a apaixonar.
- A apaixonar?? (Estas palavras caíram em cima de Josefino como a lâmina de uma guilhotina cai em cima do pescoço de um ladrão de maças)
- Sim, lembras-te do Manuel, filho do Sr. Hipólito da mercearia? Voltou da universidade e fomos saindo, tínhamos algumas coisas em comum, uma das quais o livro preferido. Livro esse que deixaste lá em casa antes de partires. Foste, por assim dizer, o grande propulsor da minha relação, devo agradecer-te. Parece destino, separamo-nos os dois, tu porque vais atrás da mulher dos teus sonhos, eu porque não passava pelos teus sonhos e deixas-me a "chave" da felicidade, quando julguei que tudo estava perdido. Então e tu? Conta-me como foi lá na grande cidade.
- Eu… o livro… o Manuel?? Não conheço…
- Vá eu não tarda apresento-vos. Mas conta lá da viagem.
- A viagem… A viagem não foi nada do que estava à espera, eu acho que as pessoas quando falam dela enaltecem qualidades que nem sequer as chegam a ser. Percorri ruas inteiras, sem ninguém com quem comentar o degredo que as ruas se revelavam. Gostei dos espaços culturais, de algumas conversas, de algumas amizades, se assim lhe posso chamar, que travei com uma ou outra pessoa, mas nada, nada que se possa comparar às pessoas daqui. Lá vive-se a um ritmo alucinante, não se pode confiar em ninguém e as pessoas esquecem-se de quem entra nas suas vidas. (Talvez Josefino começasse a perceber que afinal Manuel teria voltado porque já há muito se teria apercebido da decadente sociedade que habita as cidades)
- A serio? Tenho visitado cidades com o Manuel, se bem que viajo esporadicamente, nunca fiquei por lá o tempo suficiente para me aperceber dos defeitos, mas todos me pareceram muito simpáticos e acolhedores. Mesmo os espaços nocturnos, apesar do fumo que lhes é característico (Maria sempre odiou vícios estúpidos) me pareceram sítios fantásticos. Bom, vou andando Josefino, o Manuel espera-me na mercearia.
- Mas vocês namoram?
- (A afastar-se apressadamente) Eu depois conto-te, até logo!
Josefino ficou agarrado ao chão, o seu corpo mostrava-se agora incapaz de dar um passo que fosse, enquanto, na sua cabeça as ideias, os pensamentos voavam alucinantemente.
Partiu atrás da mulher dos seus sonhos (que ao que parece estaria sempre na sua vida), voltou sem a encontrar e ainda por cima perdera a sua amiga de sempre. Que mudara, entretanto para a mulher que ele sempre procurou. Tornou-se na mulher culta, apreciadora de artes, intelectual, inteligente, com um sorriso estonteante, como nunca lhe dissera.
E continuou sempre igual a si mesma. Nada nela mudou, nada nela se extinguiu, pelo contrário, toda ela renascera, toda ela o atraía. “Tenho de lhe dizer o que sinto, tenho de lhe explicar que afinal toda esta viagem só deu para perceber o quanto é importante para mim.”
Josefino dirige-se a casa de Maria.
- Maria!!! Maria!!! Preciso falar contigo. (Parecia aflito)
- Sim, o que aconteceu. (assustada)
- Maria, tenho de te contar e confessar o que tenho vindo a sentir. Desde que parti fui-me apercebendo da falta que me tens vindo a fazer. Procurei por alguém que sempre tive. E só depois de ter partido dei conta de que quem realmente queria eras tu.
- Josefino, quando partiste passei precisamente pelo que me descreves, mas fiquei, nada poderia fazer. Decidiste partir sozinho, parti do principio que querias romper com o passado. E esperei. Curiosamente no livro que me emprestaste li o seguinte “O que é teu por ti espera ou a ti virá”. Entretanto conheci o Manuel, que a meu ver veio até mim. Se é "meu" ou não o tempo o dirá.
- Mas Maria, não podes apagar o nosso passado.
- Não, não posso, mas parece que apagamos o nosso futuro, pelo menos o futuro de que falas.
- Mas como é que em tão pouco tempo foste capaz de te esquecer de mim?
- Da mesma forma de que durante tanto tempo não foste capaz de "olhar para mim. Talvez tenha sido isso. Além disso, o Manuel mostrou-me muitas coisas que eu não conhecia e fez questão de me explicar como funcionam. Apaixonei-me desde logo pela maneira como ele olhava para o que para mim era simples e banal e transformava tudo isso em algo fantástico e fascinante. Ele ia ao ínfimo de cada coisa simples que eu conhecia e tornava-a complexa. Comecei não só a apaixonar-me por ele, mas também pelas coisas que comecei a ver com ele.

Josefino, que partira com a ideia de que Maria não era nada mais do que uma amiga, voltou com a certeza de que desde sempre fora apaixonado por ela. E agora, agora mesmo que volte a partir não vai encontrar Maria, nem outra pessoa que seja parecida com ela. E se o for, certamente não o irá atrair. O amor é como a magia, cada paixao é um “truque” e um truque só é fascinante até o entendermos, depois torna-se banal.
Outras viagem esperam o Josefino, outros truques aparecerão, pensa ele.


Um dia destes no Wood surgiu a ideia de fazer uma peça de teatro, ideia de Fábio Barbosa, portanto comecei a treinar, so me falta conseguir fazer dialogos. ora aí está.

2 comentários:

Era uma vez... Um menino muito pequenino, sentado à janela do seu quarto. Dali via um pequeno riacho, umas escadas, daquelas que já não há, ...